quinta-feira, 14 de março de 2019

Gestão Co-participada da Reserva Nacional de Chimanimani: Um Desafio para as Políticas Florestais Integradas Faculdade de Letras e Ciências Sociais Gestão Co-participada da Reserva Nacional de Chimanimani: Um Desafio para as Políticas Florestais Integradas Licenciando: Ezequias Erasmo José Supervisor: Egídio Guambe, PhD Maputo, 2018 Faculdade de Letras e Ciências Sociais Departamento de Ciência Política e Administração Pública Curso: Licenciatura em Administração Pública Regime: Laboral Disciplina: Trabalho de Fim do Curso Período: Outubro de 2018 Gestão Co-participada da Reserva Nacional de Chimanimani: Um Desafio para as Políticas Florestais Integradas Licenciando: Ezequias Erasmo José Trabalho de Fim de Curso a ser apresentado à Universidade Eduardo Mondlane, Departamento de Ciência Política e Administração Pública, como requisito parcial para obtenção do grau de licenciatura em Administração Pública Supervisor ___________________________________ Maputo, 2018 Gestão Co-participada da Reserva Nacional de Chimanimani: Um Desafio para as Políticas Florestais Integradas Trabalho de Fim de Curso apresentado em cumprimento dos requisitos exigidos para a obtenção do grau de licenciatura em Administração Pública na Universidade Eduardo Mondlane, Faculdade de Letras e Ciências Sociais, Departamento de Ciência Política e Administração Pública. O Júri _______________________________________________ (Presidente) (Universidade Eduardo Mondlane) _______________________________________________ (Supervisor) (Universidade Eduardo Mondlane) ________________________________________________ (Oponente) (Universidade Eduardo Mondlane) DECLARAÇÃO DE HONRA Declaro que esta monografia nunca foi apresentada para a obtenção de qualquer grau ou num outro âmbito e que ele constitui o resultado do meu labor individual. Esta monografia é apresentada em cumprimento parcial dos requisitos para a obtenção do grau de licenciado em Administração Pública, no Departamento de Ciência Política e Administração Pública, da Universidade Eduardo Mondlane. Maputo, Outubro de 2018 O licenciando ____________________________________ Ezequias Erasmo José DEDICATÓRIA À minha mãe Madalena Miquicene AGRADECIMENTOS No final de um trabalho longo, quando paramos para reflectir sobre os que deram força para o término, nos deparamos com a falta de uma memória gigantesca para nos recordamos de todos que contribuíram. E, este caso não é excepção. Sendo assim, agradeço a todos que directa ou indirectamente contribuíram. Em especial, gostaria de registar os meus agradecimentos: Ao meu supervisor, Egídio Guambe, pela paciência e orientação deste trabalho. Pelas sugestões, insistências e correcções dos conteúdos que enviava; Ao Administrador da reserva de Chimanimani, engenheiro Lionel Macicane pelos conselhos e sugestões sobre vários aspectos do trabalho, como também pela atenção, boa recepção, sou muito grato; À minha mãe, Madalena Miquicene, que sempre esteve de mãos aberta para custear todas despesas na realização deste trabalho; Aos professores do Departamento de Ciência Política e Administração Pública da Faculdade de Letras, em especial, ao professor José Jaime Macuane, Eduardo Sitoe, Salvador Cadete Forquilha, Tomás Fuel, Adelino Pimpão, Salvador Watata, Domingos do Rosário, Sónia Shone pelos ensinamentos académicos e sociais que usarei onde eu estiver; À Dércio Tsandzana e Miguel Osório pela paciência que tiveram para fazer revisão do trabalho, tecendo sugestões e comentários, obrigado por tudo; Aos meus colegas do curso de Administração Pública e Ciência Política, do ano de 2014, e ao Vo grupo de Administração Pública em especial, pela família que acabamos tornando. Por tudo que aprendi nos trabalhos em grupo, nas preparações, só momentos lindos vivi ao vosso lado, sou eternamente grato; Aos meus amigos, Álvaro Alfredo, Francisco Nhacudime Júnior, Abdul G. M. Tavares, Stefania Bambo, Fátima Saieze, Ercília Júlio, Júlio Sualé, Nelson Vetevene, Francisco Cossa, Momade Isac, João Baptista, Bruno Elija, Ismael David e Armando Venâncio Chicamasso em especial à Maurício Mundinho pela força que me foi dada no momento de fadiga, pelas leituras e sugestões dos conteúdos. LISTA DE ABREVIATURAS E ACRÓNIMOS AMRU – Organização para o Empoderamento da Mulher Rural ANAC – Administração Nacional das Áreas de Conservação BIOFUND – Fundação para a Conservação da Biodiversidade CAMPFIRE – Communal Areas Management Programme for Indigenous Resource CFA – Conservation Finance Alliance CTF – Conservation Trust Fund DNAC – Direcção Nacional de Áreas de Conservação DPTADRPM – Direcção Provincial da Terra Ambiente e Desenvolvimento Rural da Província de Manica DUAT – Direito de Uso e Aproveitamento de Terra GEF – Global Environment Facility GESON – Grupo de Educação Social de Manica IAC – Instituto Agrário de Chimoio ICM – Instituto de Cereais de Moçambique IDA – International Development Association IIAM – Instituto de Investigação Agrária de Moçambique ISAP – Instituto Superior de Administração Pública ISRI – Instituto Superior de Relações Internacionais MITADER – Ministério da Terra, Ambiente e Desenvolvimento Rural MozBio – Projecto de Áreas de Conservação para Biodiversidade e Desenvolvimento ONG’s – Organizações não-Governamentais ORAM – Organização Rural de Ajuda Mútua PAC – Programa de Activistas Culturais SADC - Southern African Development Community SEMOC – Seed Company of Mozambique RENAMO – Resistência Nacional de Moçambique UEM – Universidade Eduardo Mondlane UICN – União Internacional para a Conservação da Natureza USAID – United States Agency for International Development WWF – World Wildlife Fund - Fundo Mundial para a Vida Selvagem RESUMO Gestão Co-participada da Reserva Nacional de Chimanimani: Um Desafio para as Políticas Florestais Integradas O envolvimento de múltiplos actores na gestão de política de conservação dos recursos florestais é a mais moderna abordagem adoptada por governos de diferentes países para responder às expectativas dos cidadãos através da sua colaboração na elaboração e implementação conjunta. Aliás, é igualmente uma modalidade usada para diminuir ou melhorar a intervenção do Estado na gestão pública. A presente pesquisa, procura analisar as dinâmicas de colaboração entre múltiplos actores na gestão da reserva de Chimanimani, se por um lado, as autoridades centrais, provinciais e os doadores estão preocupados em melhorar a gestão de Chimanimani na base de uma abordagem exclusivamente burocrática e técnica, por outro, as comunidades vêm nos mesmos recursos de Chimanimani, elementos de melhorar as suas condições de sobrevivência quotidiana. O trabalho aborda o objecto a partir da perspectiva de gestão co-participada, vista como um mecanismo colaborativo de conjugação de sinergias para efectivação da acção pública. Pressupõe-se que a convergência de interesses entre múltiplos actores e consequentemente, o sucesso da gestão da política de conservação da biodiversidade de Chimanimani está associado aos mecanismos de coordenação e interacção entre os doadores, o Governo, o sector privado, as ONG’s e os actores locais na gestão conjunta e activa, assim como, ao desenvolvimento de actividades sustentáveis em termos económico, social e ambiental tais como: ecoturismo, fomento da produção de mel, de peixe, capacitação das comunidades como fiscais e guias turísticas. Palavras-chave: conservação dos recursos; convergência de interesses; gestão co-participada; reserva de Chimanimani; ecoturismo. EPÍGRAFE A conservação da biodiversidade não é apenas um trabalho para o Governo. Organizações governamentais e não-governamentais, o sector privado e todo e qualquer individuo têm um papel importante na mudança de mentalidade e de comportamentos destrutivos. Kofi Annan (2004) ÍNDICE DECLARAÇÃO DE HONRA i DEDICATÓRIA ii AGRADECIMENTOS iii LISTA DE ABREVIATURAS E ACRÓNIMOS iv RESUMO v EPÍGRAFE vi INTRODUÇÃO 1 Contextualização 4 Problemática da Pesquisa 6 Objectivos de Pesquisa 10 Delimitação do objecto de estudo 10 Justificativa: 11 Breve revisão de literatura e perspectiva teórica de estudo 13 Metodologias do trabalho 20 PARTE I: ESPAÇO E INTERACÇÕES DE ACTORES NA RESERVA NACIONAL DE CHIMANIMANI Capítulo I: Chimanimani como reserva e espaço de conflito de interesses 24 1.1. Antecedentes históricos de criação de Chimanimani 24 1.2. Criação de Chimanimani como reserva nacional 27 1.3. Chimanimani em busca de um modelo de gestão 28 Capítulo II: actores, interesses e representação na gestão de Chimanimani 31 2.1. O papel de diferentes actores na gestão de Chimanimani 31 2.2. Mecanismos de coordenação e gestão de Chimanimani 34 PARTE II: MEDINDO O DESEMPENHO DA POLÍTICA DE GESTÃO DE CHIMANIMANI Capítulo III: Ecoturismo inclusivo e a confluência de interesse entre múltiplos actores na gestão da reserva 35 3.1. Co-gestão na gestão de Chimanimani: um exercício complexo? 35 3.2. Desenvolvimento do ecoturismo como estratégia de melhoria da gestão de Chimanimani 37 Capítulo IV: Da dependência de interesses das comunidades para melhoria de gestão de Chimanimani 39 4.1. Mecanismos de redução da dependência das comunidades como estratégia de gestão de Chimanimani 39 4.2. Desenvolvimento das comunidades através da gestão de projectos locais em parceria com o sector privado 41 CONSIDERAÇÕES FINAIS 43 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS 45 Anexo 1: Guião de entrevista para as comunidades de Moribane e Maronga vii Anexo 2: Instituições entrevistadas ix Anexo 3: Pessoas entrevistadas x Anexo 4: Cronograma de actividades xii LISTA DE MAPA Mapa 1. Mapeamento dos actores na gestão de Chimanimani 31 LISTA DE FOTO Foto 1: Construção do Lodge em Moribane 42 INTRODUÇÃO A lógica de concepção de uma política pública mudou relativamente a alguns anos atrás, em que o Estado era o único formulador. Actualmente, já se pensa em conjunto, projecta-se em conjunto, executa-se em conjunto e avalia-se em conjunto. Explorar em conjunto todo o ciclo de políticas públicas, desde a fase em que os problemas das comunidades ganham ou perdem a atenção do público, ou seja, quando as demandas entram como inputs no sistema político, posteriormente filtrados na “caixa negra” até quando o produto (outpts) sai em forma de programas, políticas, decretos e resoluções. Aliás, a “caixa negra” não é mais um espaço exclusivo das autoridades públicas. Para o sucesso de uma política pública, já não se pensa que o Estado é o único actor que participa na gestão. De acordo com Ronconi, Debetir e Mattia (2011) desaparece a concepção tradicional do Estado como núcleo exclusivo da gestão das políticas públicas, os doadores, sector privado, as ONG’s e os cidadãos passam a ser co-produtores e parceiros na perspectiva de partilha de responsabilidades. Estes, não são actores passivos mas, têm uma participação activa e directa na concepção e gestão da política (Bovaird, 2007). A gestão co-participada na reserva de Chimanimani foi fortemente influenciada pelas necessidades quotidianas das comunidades locais, sobretudo pela forte dependência das comunidades aos recursos da reserva. Diante disso, Matos (2011) informa que essa abordagem de gestão conjunta respondia aos interesses das agências internacionais, como é o caso do Banco Mundial que incutia a ideia de que com o envolvimento das comunidades se alcançaria o uso sustentável dos recursos naturais e, consequentemente caminho para a fuga para a melhoria das condições de sobrevivência. Para o Banco Mundial e World Wildlife Fund (WWF) essa abordagem de gestão conjunta nas áreas de conservação se assentava naquilo que eram as suas exigências para a maior parte dos países africanos, exemplo Senegal e Madagáscar, que era a retirada do Estado como principal agente de gestão, visto que na gestão co-participada das áreas de conservação partilha-se o controlo e a responsabilidade dos recursos naturais junto as comunidades, sector privado e ONG’s. O trabalho discute a co-produção da política do sector ambiental, buscando compreender a colaboração de múltiplos actores na gestão da política de conservação dos recursos florestais da reserva de Chimanimani de modo a alcançar o seu sucesso. Porém, a divergência de interesses entre os doadores, autoridades governamentais, sector privado e as comunidades compromete a preservação e a conservação destes recursos, na medida, em que as comunidades dependem dos recursos da reserva para o seu sustento, tanto que precisam dos recursos de Chimanimani para melhorar a sua condições de sobrevivência. A gestão co-participada nas áreas de conservação busca na verdade, retirar a responsabilidade do Estado como único gestor, aproveitar-se as condições de biodiversidade existentes para a entrada do sector privado (ou da sociedade civil, incluindo as comunidades locais) na exploração do potencial turístico, conscientizando-as sobre a degradação dos recursos florestais a partir das suas anteriores actividades de subsistência com destaque para a agricultura (Cônsul, 2002. p. 205). O trabalho faz uma análise de colaboração de múltiplos actores na gestão da reserva de Chimanimani a partir da abordagem da gestão co-participada, definida como sendo uma perspectiva de desenvolvimento das áreas de conservação da biodiversidade que dá enfoque à participação das comunidades locais, sector privado e ONG’s na gestão dos recursos florestais; devolve às comunidades locais a propriedade da terra e dos recursos florestais existentes nela, atribuindo-lhes maior poder de decisão sobre a melhor forma de uso dos mesmos; e permite que as comunidades se beneficiem da sua exploração (Adam, et al., 1999. p. 35). Para IUCN (1999, p. 23) a co-gestão das áreas de conservação implica: Uma comunidade com direitos de propriedade, institucionalmente estruturada com interesses colectivos e reconciliação interna. Isso implica também que a gestão de recursos naturais deve ser de, por e para a comunidade. Uma comunidade deveria ser então o actor de dianteira, com parceria do governo e outras agências externas que desempenharão papel de apoio . A gestão co-participada se apresenta como a estratégia mais adequada para a preservação dos recursos florestais e que as comunidades possam se beneficiar na exploração destes, pois, as comunidades entrem com o recurso natural e o sector privado com o capital, permitindo, deste modo, que haja uma colaboração entre as partes, tendo o Estado como regulador e/ou o mediador, isto é, trata-se de um circuito de colaboração de interesses entre múltiplos actores na gestão da reserva (Matos, 2011. P. 62). A exploração dos recursos existentes na reserva de Chimanimani na opinião de Buarque (2006. p. 76) apenas pode ser feita a partir do ecoturismo, considerado como a actividade que melhor compatibiliza a exploração dos recursos florestais. A exploração dos recursos de Chimanimani para atender aos objectivos de conservação implica neste caso a sua conformação para responder ao ecoturismo. Essa transformação implica a reestruturação da organização, do espaço territorial das comunidades com implicações sociais e económicas. Estrutura do trabalho O trabalho está estruturado em duas partes e quatro capítulos, além da introdução, contextualização, problemas de pesquisa, objectivos, delimitação do tema, justificativa, breve revisão de literatura e perspectiva teórica de estudo, metodologias do trabalho, considerações finais e referências bibliográficas. A primeira parte denominada por espaço e interacções de actores na reserva nacional de Chimanimani está composta por dois capítulos: o primeiro aborda assunto referente aos antecedentes históricos de criação de Chimanimani, seguida pela descrição da reserva nacional de Chimanimani. O segundo capítulo denominado por actores, interesses e representação na gestão de Chimanimani, discute-se as ideias referentes ao papel de diferentes actores na gestão de Chimanimani e os mecanismos de coordenação e gestão de Chimanimani. A segunda parte é composta também por dois capítulos: o terceiro denominado por ecoturismo inclusivo e a convergência de interesse entre múltiplos actores na gestão da reserva, neste capítulo expõe a relevância da co-gestão na gestão de Chimanimani e apresenta o desenvolvimento do ecoturismo como uma estratégia de melhoria da gestão de Chimanimani. O quarto capítulo mostra em que medida a redução da dependência das comunidades e o desenvolvimento delas através da gestão de projectos locais geridos em parceria com o sector privado pode ser uma estratégia de gestão da reserva de Chimanimani. Contextualização Chimanimani localiza-se no distrito de Sussundenga, província de Manica, ao longo da fronteira com a República do Zimbabwe. A reserva de Chimanimani compreende uma área aproximada de 2756 km2 e, cobre as terras altas, desde a nascente do rio Mussapa Grande, seguindo para as terras de Mahate até Zomba, com orientação para sudeste em direcção a Marronga e Haroni-lucite (Araman, 2002. p. 216). O nome de Chimanimani provém da língua Chitewe que significa passagem estreita. Todavia, passagem estreita é uma abertura da montanha usada por muitos anos como um meio de passagem entre as comunidades locais e o povo vizinho zimbabwiano com destino a sua fixação em Moçambique. Na mesma linha de ideia, Tornimbeni (2007. p. 484) refere que esse nome surge pelo facto de haver uma abertura estreita na montanha, por onde passavam os antepassados dessa região. A reserva nacional de Chimanimani, foi criada pelo decreto 34/2003, de 19 do Agosto e foi identificada pelo Plano Estratégico para o Desenvolvimento do Turismo em Moçambique como um importante destino turístico, incluído na “rota central de ecoturismo” que liga Beira: reserva de Marromeu, parque nacional de Gorongosa e montanha da Gorongosa; Cidade de Chimoio inclui a reserva de Chimanimani e Lago Chicamba. A reserva nacional de Chimanimani é a mais recente área protegida estabelecida nas Áreas de Conservação Transfronteiriça de Moçambique (programa de implementação das Áreas de Conservação Transfronteiriça), nomeadamente: em Maputo (Libombos, envolvendo Moçambique, África do Sul e Suazilândia), em Gaza (Grande Limpopo, envolvendo o Kruger Parque na África do Sul e o Gonarezhou no Zimbabwe) e Chimanimani (que também inclui o Chimanimani do Zimbabwe) protegendo o único ecossistema afro-montanha do país. A reserva de Chimanimani é composta por cinco áreas de conservação que contribuem para a protecção e manutenção da diversidade e dos recursos naturais associados. Apesar de Chimanimani congregar várias comunidades, a busca pelos meios de sobrevivência, como: expansão de campos agrícolas, corte de troncos para o fabrico de carvão vegetal, tem gerado sérios problemas na gestão e conservação da biodiversidade da reserva. Um dos objectivos de gestão da reserva de Chimanimani é responder a tendência global de alargar a extensão das áreas de conservação, incorporando ecossistemas críticos ou permitir que os animais selvagens tenham maiores áreas para levarem acabo seus ciclos de vida, melhorar a vida das comunidades que vivem dentro da área, através da gestão dos recursos naturais e reforçar institucionalmente os Serviços Provinciais de Florestas e Fauna Bravia (MITUR, 2004). Na perspectiva de UICN (2002) Chimanimani torna-se numa das principais áreas de conservação com a máxima importância socioeconómica, pois, as comunidades locais dependem fortemente dos produtos florestais não madeireiros, como: cogumelos, frutos silvestres, mel e ervas medicinais. Por sua vez, as comunidades têm crenças culturais e tradicionais a favor da conservação da biodiversidade. As crenças nas florestas sagradas e a água das piscinas, por exemplo, regulam o uso da flora e da fauna que ocorrem em tais áreas. Chimanimani sendo caracterizada como uma reserva que integra no seu interior bem como na zona tampão as comunidades, constituídas de famílias sem emprego formal se não a utilização dos recursos naturais que lhes rodeiam. Para a subsistência, estas tem contribuindo para as alterações sobre a utilização dos recursos florestais, desenvolvendo a agricultura itinerante, desmatamento para corte de material de construção e construção de casas, para além, de fabrico de carvão vegetal (Jaime, 2015. p. 10). A principal actividade das comunidades é a agricultura de subsistência. Dada a relativa quantidade de terra disponível para a prática da agricultura, constata-se que esse factor influencia no tipo de agricultura a ser exercido. A perca da qualidade do solo, que em geral ocorre de dois em dois anos, “obriga” as comunidades locais a abandonarem os campos de cultivo e a abrirem novos, como forma de manterem constante o nível de produção de alimentos (Artur, 2000). Os principais produtos cultivados pelas comunidades de acordo com Artur (2000) são: o milho, a mapira, o arroz, o gergelim, a banana, a mandioca e hortícolas. Em tempo de fraca produção, as comunidades se alimentam de frutos silvestres. Para além da agricultura, as comunidades desenvolvem a caça, criam alguns animais (como a galinha) e produzem o mel. Portanto, o principal destino da produção é o consumo, em caso de excedente e, dependendo da procura de um determinado produto (como a banana e o gergelim), o mercado apresenta-se como uma alternativa. A relação entre população e mudanças no uso dos recursos florestais tende a ser mais directa e espacialmente correspondente em economias nas quais a agricultura tradicional é predominante. Assim, a agricultura tradicional serve de base de sobrevivência entre as comunidades de Chimanimani visto que na região não existe outras formas de emprego. Contudo, Chimanimani sendo uma área de conservação e com uma paisagem excepcional, a alteração da paisagem para fins agrícolas e residencial pode afectar de forma negativa as riquezas florestas e consequentemente o desenvolvimento ecoturístico da região. Problemática da Pesquisa Em Moçambique, cerca de 25% do território está oficialmente declarado como sendo de áreas de conservação . Estas áreas incluem, oito parques nacionais, sete reservas, uma área de protecção ambiental, 20 coutadas oficiais, três áreas de conservação comunitárias e 50 fazendas (Sitoe e Maússe, 2012. p. 59). Grande parte das áreas de conservação nacional foram criadas no tempo colonial entre anos 1960 e 1970 com o objectivo de: (i) proteger as áreas florestais para manter um stock de madeira para abastecer as serrações, para mobiliário do Estado e construções urbanas; (ii) reduzir a destruição da floresta, devido a prática da agricultura itinerante e das queimadas descontroladas; e, (iii) conservar e proteger as nascentes de rios e bacias hidrográficos (Gomes e Sousa, 1968). Durante o período da guerra civil, as áreas de conservação foram utilizadas pelas comunidades locais para se albergar, o que resultou em uma forte depleção da sua “biodiversidade ” (Byers et al., 2013). E em algumas destas áreas como Chimanimani, especificamente Moribane e Maronga ainda têm população à residir tanto na zona de tampão como no interior da reserva (Sitoe et al., 2006). Esta presença humana é segundo os autores atraída pela existência de produtos com valor de mercado, tais como: madeiras comerciais, animais de caça bem como pelo fácil acesso para as actividades agrícolas. As áreas de conservação são um dos mecanismos ou estratégia de preservação dos recursos ambientais adoptados no mundo inteiro, as perturbações ambientais em massa causadas pelo homem têm alterado e destruído a paisagem e a biodiversidade em larga escala, levando espécies em extinção, as grandes ameaças a diversidade biológica proveniente da actividade humana são: destruição ou fragmentação, degradação de habitats incluindo poluição, super exploração de espécies para uso humano (Cabral e Souza, 2002). A criação de Chimanimani como uma reserva nacional foi influenciada por um conjunto de actores: USAID, Banco Mundial e Fundação Ford, a presença desses actores fez com que tivessem o poder de determinar o direccionamento da política de conservação de Chimanimani e os outros actores, como o sector privado, as ONG’s e as comunidades locais se submetesse aos seus princípios e interesses (Matos, 2011. p. 125). Assim, a ideia de submissão aos objectivos de gestão da reserva não foi bem recebida pelas ONG’s, isso porque acreditavam que o investimento privilegiaria as agências públicas no sentindo de apoderamento dos fundos que seriam usados para a gestão da reserva e do possível contrabando de madeira. E que estes actores públicos não se preocupariam na verdade em preservar dos recursos naturais e melhorar as condições de sobrevivência das comunidades mas satisfazer os seus próprios anseios (Jaime, 2015. p. 38). A falta de confiança entre diversos actores na implementação do projecto na criação de Chimanimani fez com que surgisse o conflito de interesse sobre a gestão dos recursos da reserva. Para Simbine; Folowa e Nhussi, (s/d) o conflito de interesse surge não só com a falta da gestão integrada das legislações aprovadas no final dos anos 1990 mas também, com os benefícios que actores teriam com a criação de Chimanimani, sobretudo com a desconfiança entre os actores envolvidos. Ora, a gestão de Chimanimani é feita directamente pelo Estado, através da Administração Nacional das Áreas de Conservação (ANAC) de acordo com os meios humanos e financeiros que o Orçamento do Estado lhe aloca e dos investimentos ou fundos disponibilizados pelos doadores. A dificuldade de obtenção de fundos financeiros e de falta de recursos humanos para gerir as reservas nacionais faz com que não se efectivem os objectivos da política de conservação da biodiversidade. Por outro lado, a gestão das reservas por um único órgão é considerado inoperante, na medida em que as comunidades, o sector privado e as ONG’s não participam directamente na gestão (Lamarque e Magane, 2007. p. 70). Em Chimanimani, a necessidade pela procura de meios de sobrevivência obriga as comunidades a praticar actividades que compromete os objectivos de conservação da reserva, dos recursos florestais, faunísticos e na destruição de zonas de desenvolvimento ecoturístico. Assim, a degradação florestal da reserva resulta do corte selectivo de árvores, queimadas descontroladas ou de abertura de pequenas áreas para machambas dentro de florestas (Ribeiro, 2011). A exploração e utilização dos recursos florestais da reserva de Chimanimani, da forma como vem sendo realizada, ameaça a conservação e a perpetuação destes recursos a médio e longo prazo ao nível local. Como se pode ver, o interesse do Governo em transformar a reserva nacional de Chimanimani em uma atracção ecoturística, se confronta com o interesse imediato das comunidades ligadas em garantir a sua sobrevivência. Apesar de Chimanimani ser gerida pela ANAC, a implementação de actividade ecoturística é feita por vários actores tais como: Biofund, Fundação Micaia e Associação Cubatana Moribane, entre outros. A actuação de múltiplos actores na gestão e desenvolvimento do ecoturismo transformou Chimanimani numa área de disputa de interesses diferentes, constituído por actores localizados a escala local (as associações locais e comunidades), actores localizados a escala central (agências públicas que são facilitadoras e responsáveis pela implementação da política de gestão de Chimanimani) e a escala internacional (USAID e Banco Mundial, responsáveis por definir e impor a política). Ao se transformar Chimanimani em um espaço de disputa de interesses diversos, se formam grupos de actores que apresentam visões e objectivos de gestão diferentes. Se por um lado, temos actores que participam na gestão da reserva através de investimentos de projectos ecoturísticos, tidos como doadores; por outro, actores centrais que desenvolvem ou materializam tais projectos. Os actores locais, as comunidades, sector privado e ONG’s que têm uma participação deficitária e limitada. O problema de conflito de interesse sobre a gestão da reserva de Chimanimani na opinião de Matos (2011) está ligado ao contrabando de madeira. Que é um dos negócios mais cobiçados em Moçambique , que beneficia um determinado grupo com privilégio informacional colocando em causa os objectivos da política de gestão de Chimanimani que são: conservação e preservação os recursos naturais e a melhoria das condições de sobrevivência das comunidades locais. Na sequência de conflito de interesse sobre Chimanimani, o Conselho de Ministros concessionou a exploração florestal para às empresas Madeira e Transportes Ataide e Cimac numa área de 19.000 hectares na comunidade de Tsetsera e 32.000 hectares na comunidade de Maronga. Para além destas explorações florestais em “regime de concessão florestal” , foram autorizados cinco operadores para trabalharem em “regime de licenças simples” (MAE, 2012). A presença destas empresas de exploração de madeiras não teve aceitação por parte das comunidades e do Centro Terra Viva, uma instituição não-governamental moçambicana, de investigação e intervenção ambiental devido ao impacto negativo vindouro com a exploração e por não respeitar a auscultação das comunidades. O problema da não auscultação das comunidades afecta consideravelmente a gestão da reserva de Chimanimani na medida em que não se verifica a inclusão delas nos processos de elaboração, implementação e gestão de política de conservação da biodiversidade de Chimanimani. De acordo com Nhantumbo e Macqueen (2004) as comunidades locais não são envolvidas na gestão da reserva de Chimanimani por causa do analfabetismo prevalecente no meio rural e a falta de conhecimento científico de gestão. Por estas razões não são envolvidas neste processo, apenas são convocadas nas reuniões para distribuição dos benefícios de exploração dos recursos florestais da reserva. Portanto, apesar da fiscalização dos recursos florestais ser o papel peculiar do Estado, Bila (2005) avança que o sentimento geral que existe é de que esta importante tarefa está sendo realizada de forma deficiente um pouco por todo país, regista-se actos ilegais no licenciamento, exploração, transporte, processamento e na comercialização dos recursos florestais. A divergência na gestão dos projectos ecoturísticos entre múltiplos actores: locais, centrais e internacionais, influência as modalidades de relacionamento nos resultados do sucesso da política de conservação da biodiversidade da reserva de Chimanimani. Enquanto, o interesse das comunidades é de melhorar as suas condições de sobrevivência através da exploração dos recursos naturais da reserva; o interesse do Estado passa por garantir a conservação dos recursos naturais de Chimanimani; o Banco Mundial e a USAID têm o interesse de investir na política de gestão; e as ONG’s têm o interesse de desenvolvimento do ecoturismo. Para orientar a nossa reflexão, avançámos com a seguinte questão: como a convergência entre múltiplos interesses de vários actores pode determinar o sucesso de gestão da política de conservação dos recursos florestais da reserva de Chimanimani? Avançámos o pressuposto de que o sucesso de uma política do sector ambiental, concebida aqui como a política de conservação dos recursos florestais, especificamente de gestão da Reserva de Chimanimani, depende do melhor envolvimento dos múltiplos actores no processo para uma melhor apropriação dos objectivos perseguidos. Na nossa percepção, existe, portanto, uma relação e colaboração entre múltiplos actores e os resultados da política de conservação da biodiversidade da reserva de Chimanimani. Objectivos de Pesquisa Geral Analisar as dinâmicas de colaboração entre múltiplos actores na gestão dos recursos florestais da reserva nacional de Chimanimani. Específicos  Descrever os mecanismos de envolvimento das comunidades locais na gestão dos recursos florestais da reserva de Chimanimani;  Identificar os actores e seus interesses na gestão dos recursos florestais da reserva de Chimanimani;  Discutir diferentes estratégias implementadas em parceria com o sector privado para à melhoria de gestão de Chimanimani. Delimitação do objecto de estudo A presente pesquisa vai procurar reflectir sobre a gestão de Chimanimani a partir de um estudo sobre a colaboração entre os doadores (Banco Mundial, USAID), as autoridades governamentais e administrativas, o sector privado, as ONG’s e as comunidades locais na gestão dos recursos florestais da reserva de Chimanimani. O objecto de estudo é a reserva nacional de Chimanimani, criada pelo Decreto no 34/2003, de 19 de Agosto, no âmbito da gestão sustentável dos recursos naturais. Chimanimani é constituída por cinco reservas florestais nomeadamente: Moribane, Maronga, Zomba, Mahate, e Tsetsera. A pesquisa circunscreveu-se nas comunidades de Moribane e Maronga no distrito de Sussundenga, província de Manica no período entre 2015 a 2017. As comunidades de Moribane e Maronga tornam-se um campo de estudo preferencial pelo facto de ser uma das primeiras áreas comunitárias, transformada em Área de Conservação antes de 2003. Como se tratava de áreas comunitárias que passariam a ser de conservação, a presença de populações era significativa que em muitos casos, ocupavam e exploravam estas áreas cujo valor de biodiversidade era alto. Com a criação de Chimanimani como reserva nacional passou a não ser permitido a permanência de comunidades. Assim, a gestão de Chimanimani passou a ser um dilema, pois a área era ocupada, desde muito, por comunidades que se consideravam “donas” e que haviam construído uma identidade com o lugar. Justificativa: Por que a gestão co-participada na Reserva de Chimanimani no período entre 2015 a 2017? O estudo da gestão co-participada de uma política pública torna-se necessário no campo de Administração Pública na medida em que insiste no envolvimento de várias entidades, investidores da política, autoridades governamentais e administrativas, sector privado, ONG’s e cidadãos como colaboradores e parceiros para a concepção, gestão e efectivação da política pública de modo a respondar as expectativas e as necessidades dos cidadãos. A adopção de um modelo de gestão conjunta, que privilegia o envolvimento das comunidades, das ONG’s e sector privado torna-se resposta aos problemas de conflitos de interesses entre entidades públicas, privadas, doadores e comunidades sobre a gestão da reserva de Chimanimani na medida em que vai-se melhorar a conservação da biodiversidade na reserva através de partilha de responsabilidade. Assim, a escolha de Chimanimani como objecto de reflexão tem essencialmente duas razões: Primeira, Chimanimani foi criada em 2003, num período de reconstrução e restruturação do Estado Moçambicano, marcada pela recuperação da economia devastada pelas guerras (de libertação colonial e desestabilização), e outra, pelos fenómenos naturais principalmente as cheias e secas no final dos anos 1990 e início dos anos 2000 do século XXI que cravaram o país, tornando num dos mais pobres da África Austral (Sitoe et al., 2012). Para fazer face a esses problemas, o governo moçambicano priorizou o desenvolvimento da agricultura, uma actividade orientada pelas empresas SEMOC, dedicada à produção de sementes de produtos alimentares e Instituto de Cereais de Moçambique (ICM) focado na comercialização dos produtos agrícolas advindos da exploração das áreas de Moribane e Maronga. A actuação dessas empresas perigou demasiado a questão de gestão dos recursos naturais da reserva, facto que ainda se sentem nos dias actuais as consequências ambientais tais como: degradação do solo, redução de água nos rios (Jaime, 2015). A segunda razão da escolha da reserva de Chimanimani está ligada ao problema de contrabando de madeira. Actividade protagonizada, na maioria dos casos, por actores centrais com nível de informação profunda sobre a fiscalização dos recursos florestais e o valor desses recursos no mercado interno e externo (WWF, 2016). Tanto o contrabando de madeira quanto a limitação das comunidades e as ONG’s na gestão de Chimanimani contrariam os objectivos da política de conservação dos recursos florestais. A falta de clareza dos limites geográficos da Reserva de Chimanimani faz com que algumas famílias não saibam, se vivem dentro ou fora da reserva e se os recursos que estão a ser explorados ilegalmente, são ou não para conservação. Aliada também, a existência de duas empresas Madeira, e Transportes Ataide e Cimac numa área de 19.000 hectares na comunidade de Tsetsera e 32.000 hectares na comunidade de Maronga concedida pelo governo sem a prévia auscultação das comunidades, o que mostra uma clara limitação no processo de gestão de Chimanimani. O período de pesquisa é de 2015 a 2017. A escolha desta delimitação temporal justifica-se pela implementação do projecto MozBio que tem como objectivo aumentar a gestão eficaz de Chimanimani e melhorar as condições de sobrevivência das comunidades locais. A escolha de Moribane e Maronga, como áreas florestais de estudo, deve-se ao facto de serem as primeiras áreas de conservação florestal de Chimanimani criadas antes dos anos 1990. A criação destas reservas fez com que as comunidades locais fossem expulsas das casas, machambas, isto é, abandonassem as suas terras. A expulsão das comunidades nas suas terras foi seguida pela sua limitação no processo de gestão da reserva de Chimanimani. A limitação das ONG’s e do sector privado no período de criação de Chimanimani, actores que teriam interesses em desenvolver actividades ecoturísticas na reserva de Chimanimani, fez com que os doadores, o governo de Moçambique e as comunidades locais actuassem e utilizassem os recursos de uma forma que colocasse em causa à política de gestão da reserva. A existência de interesses diversos de utilização e gestão destas áreas de conservação, mostra até certo modo, a falta de convergência de interesses entre tais actores, assim como, de uma “gestão integrada ” das políticas de conservação (Matos, 2011). Breve revisão de literatura e perspectiva teórica de estudo Para apreender o objecto de estudo, o trabalho vai se basear numa literatura sobre co-produção de políticas públicas e de serviços públicos. Esta literatura consiste no estudo da colaboração entre múltiplos actores, os prestadores de serviços, usuários assim como as agências privadas, as ONG’s e outros membros que participam na concepção e prestação de serviços. Na co-produção múltiplos actores têm uma contribuição substancial na concretização de serviços prestados (Bovaird, 2007). Aliás, de acordo com essa literatura, a maioria de serviços públicos não é feita simplesmente pela autoridade pública, mas por vários actores, públicos e privados. Tal que, muitos dos serviços públicos dependem fortemente da contribuição do tempo, do esforço das mesmas pessoas que consomem esses serviços, isto é, dos clientes ou cidadãos-usuário (Ostrom, 1999). Alguns autores como Jaworski e Kohli (1993) e Alford (2009) salientam a necessidade de melhorar as estruturas político-sociais, clima e cultura organizacional. Para os autores supracitados, faz com que uma política pública surta os objectivos pré-definidos é o ambiente envolvente entre diferentes actores, sobretudo os prestadores de serviços, o sector privado, as ONG’s e os cidadãos. Schommer et al., (2010) complementam a ideia de se observar o número e o tipo de actor na concepção dos serviços, isto porque fortifica as suas relações e interacções no processo de elaboração da política. Ostrom (1996) advoga que o sucesso da co-produção das políticas passa necessariamente por cinco estágios: i) definir os limites da aplicação dos recursos assim como o grupo alvo ou os co-gestores; ii) adaptar as regras do uso dos recursos as realidades ou circunstâncias da região a se aplicar; iii) envolver os cidadão-usuários na tomada de decisão; iv) restringir o envolvimento das autoridades governamentais internas e externas na preservação dos direitos da própria comunidade e v) desenvolver infra-estruturas (sociais) para resolver conflitos entre actores. A vantagem desta literatura para o caso em estudo é que permite apreender a participação dos diversos actores na gestão da reserva nacional de Chimanimani. A ideia é que tanto a Administração Nacional das Áreas de Conservação (ANAC), assim como a administração de Chimanimani, doadores, sector privado, ONG’s e as comunidades locais participam na gestão integrada de Chimanimani. Cada um desses actores tem o papel fundamental para a efectivação da política de gestão da reserva, mas para tal, estes devem empreender suas actividades de forma conjunta. A literatura sobre a co-produção fornece elementos importantes para reflectir sobre a gestão conjunta de Chimanimani. Uma forma que coloca as autoridades administrativas locais, os doadores, as ONG’s e as comunidades como principais actores para a efectivação da gestão de Chimaniamani. Reconhecidos estes actores, é necessários portanto, a confiança mútua, coordenação e responsabilidade entre estes, uma vez que, na concepção e gestão de Chimanimani assume-se risco. A confiança entre os actores neste processo, não só possibilita a eficiência económica para as instituições gestoras, como também serve de promotora da democracia. A esse respeito, Schommer, Bueno e Kunzler (2010) afirmam que quanto maior a confiança entre os actores, maior será o trabalho conjunto. Os autores ressalvam que uma maior confiança não elimina os conflitos de interesses nem a diversidade das opiniões, mas, possibilita um ambiente democrático, ao qual se adiciona uma relação de confiança, resultando num terreno fértil para a construção de redes. A construção de redes num ambiente de gestão co-participada favorece a horizontalidade de funções e criação sinérgica de actividade entre múltiplos actores (Ronconi, 2008). Ora, na co-produção de políticas públicas a concepção, implementação e gestão das políticas não finda nos doadores e/ou prestadores de serviços, entendemos que os cidadãos, o sector privado e as ONG’s desempenham um papel preponderante neste processo. E, para que participem, devem ser motivados, pelo que, segundo Pestoff (2012), os cidadãos não podem ser vistos como um “jack-in-the-box”, apenas esperando que alguém apresente uma alavanca que liberte imediatamente suas energias e resulte em seu envolvimento na produção de serviços. Eles precisam ser motivados, pois, quanto maior o esforço que exigem para superar obstáculos a participação, maior será a motivação em participar. Assim, a motivação dos cidadãos em co-produzir nos serviços públicos depende fortemente da recompensa material e extrínseca como as suas expectativas para gratificar o tempo e o esforço gasto (Pestoff et al., 2012). Neste sentido, Alford (2009) sublinha que as recompensas extrínsecas promovem a capacidade humana e as liberdades fundamentais, sobretudo contribuem para o bem-estar e a qualidade de sobrevivência dos cidadãos. Por outro lado, as matérias têm fundamento no engajamento dos cidadãos, promovendo-lhes para alcançar uma série de objectivos de governação local, tais como a redução da corrupção, melhoria dos serviços públicos e o aumento do capital social. Portanto, a abordagem de co-produção de serviços públicos permite-nos reflectir sobre as lógicas de gestão de Chimanimani, sobretudo, nos conflitos de interesse existente entre diferentes actores; os doadores, as agências públicas e privada, ONG’s e as comunidades. Em termo de indicadores para reflectir a colaboração entre diferentes actores na gestão de Chimanimani, a tipologia utilizada por Pestoff et al., (2015) explica com profundidade os níveis de interacções de múltiplos actores para produzir uma política pública: (i) co-governação, (ii) co-gestão e (iii) co-produção. (i) O primeiro indicador diz respeito à co-governação, que segundo Pestoff et al. (2015) refere-se aos arranjos de resultados negociados para a participação de múltiplos actores no processo de elaboração de agendas públicas, quer dizer, ocorre quando há participação dos cidadãos na concepção ou elaboração das políticas públicas ou serviços públicos. Este indicador preocupa-se com o nível de produção de decisões ou das políticas públicas, além disso, faz referência a acordos negociados como resultado da participação de múltiplos intervenientes na concepção das agendas públicas. Procurou-se perceber como esse mecanismo é, em vez de solução para os problemas de conflito de interesse entre múltiplos actores sobre a gestão da reserva, é instrumento para disciplinar os cidadãos, ONG’s e o sector privado e incentivá-los para co-gerir na política de conservação de biodiversidade de Chimanimani. (ii) O segundo indicador é a co-gestão, definido por Pestoff et al. (2015) como sendo a diversidade ou hibridização de prestação de serviços públicos, tipicamente encontrados em situação em que diferentes organizações sem fins lucrativos, ONG’s, os próprios usuários, actores privados ou actores estatais participam na prestação dos serviços públicos, ou por outra, é quando os cidadãos observam ou participam na execução ou concretização da política pública. Este indicador possibilita o desenvolvimento de actividades em parceria ou colaboração para alcançar um objectivo comum, sem que signifique necessariamente alterar as competências de cada órgão envolvido ou diminuir seu poder e/ou suas responsabilidades. O mecanismo de co-gestão dos recursos naturais, outrora utilizado por alguns Estados como o Brasil por exemplo, ajudou a melhorar a gestão dessas áreas de conservação. A co-gestão tem sido um excelente mecanismo para fazer captação de recursos financeiros e dar mais flexibilidade nas demandas das comunidades e na delapidação dos recursos florestais e faunísticos dos parques estaduais (Pádua, 2000). A partir deste indicador, vamos descrever os mecanismos de co-gestão da Reserva de Chimanimani, entanto que um processo de colaboração entre os doadores, autoridade administrativa local, as comunidades locais, organização da sociedade civil e os parceiros privados de desenvolvimentos das políticas de melhoria das condições de sobrevivência das comunidades e de conservação dos recursos florestais de Chimanimani. Assim como, analisar as responsabilidades de cada interveniente. Este exemplo permite observar as expectativas das comunidades e se há existência ou não da colaboração entre diferentes actores. (iii) Finalmente, a co-produção “emancipada”, em termos conceptuais Pestoff et al. (2015) afirmam que os cidadãos tomam a dianteira para à produção e gestão dos seus próprios serviços. Brandsen e Pestoff (2009) salientam que a co-produção “emancipada” não está confinada apenas nos cidadãos que usam os recursos ou que participam na provisão de serviços públicos, mas também, envolve outros tipos de pessoas, como, voluntários ou parceiros não-governamentais que não usufruem de serviços, mesmo assim, mostram disposição em participar na sua provisão. Gestão co-participada da reserva nacional de Chimanimani As primeiras iniciativas envolvendo a participação das comunidades na gestão dos recursos naturais datam dos anos 1960 a 1970. Segundo Mandondo e Kowero (2004) estas iniciativas estavam ligadas, principalmente, a exploração dos recursos florestais, compreendendo três variantes, nomeadamente: co-gestão de florestas; maneio florestal colaborativo e o maneio de florestas baseado na comunidade. Para o contexto da África Austral, estas iniciativas não só estiveram ligadas a exploração dos recursos florestais, como também a fauna bravia. A sua implementação data dos anos de 1970 na Zâmbia, e mais tarde, em outros países como o Zimbabwe, Tanzânia e Botswana. O sucesso alcançado em alguns países, como o Zimbabwe com o CAMPFIRE (Communal Areas Management Programme for Indigenous Resource), influenciou a sua implementação em Moçambique, ao mesmo tempo em que passava a ser o modelo de aplicabilidade. Esta iniciativa de envolvimento das comunidades teve uma ampla aceitação por parte das ONG’s e agências doadoras como a Agência dos Estados Unidos para o Desenvolvimento Internacional e o Banco Mundial porque respondiam a dois principais objectivos que eram: a conservação dos recursos naturais, que em vários países, como o caso da Zâmbia estavam a ser explorados de uma forma acelerada; a melhoria das condições de sobrevivência das comunidades, que são dependentes dos recursos naturais dos parques e reservas nacionais, associadas ao baixo nível económico. A transformação de Chimanimani em uma área de conservação, coincide com as alterações nas formas de criação e gestão das áreas de conservação, bem como na inclusão de ideias do neoliberalismo que privilegiam uma maior participação do sector privado e do envolvimento dos cidadãos na tomada de decisão, ao mesmo tempo que pretendia reduzir o intervencionismo Estatal na gestão pública (Matos, 2011. p. 20). Com efeito, a perspectiva de envolvimento das comunidades na gestão das áreas de conservação ganhou atenção do Governo moçambicano nos finais dos anos 1980. Quando se registou maior movimentação das comunidades que fixavam casas dentro das áreas de conservação, o que ameaçava a biodiversidade em Moçambique. Assim, com a criação das reservas nacionais, observou-se que a conservação dos recursos naturais sempre esteve associada à melhoria das condições de sobrevivência das comunidades e desenvolvimento do ecoturismo. Os anos 1990 foram marcados pela aprovação de leis, tais como: a Política Nacional de Terra em 1995 e a posterior criação da Lei de Terra em 1997, a Lei do Ambiente em 1997, a Lei de Florestas e Fauna Bravia em 1998 que garantiriam a auscultação das comunidades na exploração dos recursos naturais. Pimbert e Pretty (2000) referem que os conservacionistas no final dos nos 1990, começaram a tomar consciência de que uma protecção ambiental efectiva só seria possível se as comunidades locais estivessem inteiramente envolvidas no planeamento das áreas de conservação e tivessem benefícios directos da gestão dos recursos. Os benefícios mais concretos e verificáveis em algumas das iniciativas (como na Zâmbia por exemplo) são divididos em directos e indirectos. Os directos estão ligados com o investimento rural com infra-estruturais, obtenção de dividendos através das parcerias existentes na exploração dos recursos naturais e oportunidade de emprego. Os indirectos estão ligados com a manutenção ou crescimento do stock dos recursos naturais, oportunidades para a diversificação da economia rural e a sua integração na economia de mercado (WWF, 2006). O papel desempenhado pelas agências doadoras, principalmente o Banco Mundial foi fundamental para a rápida implementação da gestão conjunta em Moçambique. Adams e Hulme (2001) acreditam que a rápida aplicação da abordagem de gestão conjunta na África Subsaariana, deveu-se ao: alto nível de dependência da ajuda externa, assim como, alto nível de influência exercido pelas agências de desenvolvimento multilaterais e bilaterais nas políticas internas; e a fraqueza dos Estados africanos. Para a aplicação de gestão conjunta em Moçambique era necessário que se processassem reformas legislativas, principalmente nas leis referentes a terra, recursos florestais e a descentralização, dando os poderes de decisão sobre o uso e exploração dos recursos às comunidades locais. Estas transformações, também advogadas pelas instituições de Bretton Woods, estão presentes na abordagem de gestão das áreas de conservação. Para o caso de Chimanimani, a abordagem foi difundida pelas organizações governamentais, institutos de pesquisa e universidades, passando a ser a linguagem predominante dos discursos das agências de desenvolvimento (Negrão, 1997. p. 21). Guivant (1997. p. 411) refere que o grande interesse pela adopção dos métodos de gestão conjunta por parte das agências de desenvolvimento está ligado à esperança de que a sua implementação possa minimizar a intervenção do Estado nos custos de infra-estruturas e dos problemas organizacionais, bem como na melhoria de qualidade de sobrevivência das comunidades locais. Na óptica de Negrão (1999. p. 211) a razão para o envolvimento de vários actores na gestão de áreas de conservação na África Austral, prende-se com o facto de nas economias frágeis, como a moçambicana, os custos de operação das áreas de conservação são muito altos e existe uma permanente tensão entre os objectivos de conservação e as necessidades das comunidades. Ainda segundo este autor, Em África há três perspectivas sobre a participação comunitária: (i) a instrumentalista (na África Austral) que tem a partilha dos benefícios como moeda de troca pela conservação; (ii) a utilitarista (na África Oriental) que parte do princípio que as comunidades têm conhecimentos e direitos sobre a terra, sendo a partilha uma forma de indemnização por não poderem usar os recursos como outrora o fizeram; e (iii) a transformista (na África Ocidental) que defende que a participação tem em vista a transformação qualitativa das capacidades das comunidades com vista ao desenvolvimento (Negrão, 1999, p. 211). As perspectivas apresentadas por Negrão (1999. p. 213) afiguram ter norteado a formulação do quadro legislativo moçambicano referente ao envolvimento de diferentes actores. A perspectiva utilitarista foi a que vincou, como ficou registada no artigo 4, capítulo ii, da Política Nacional de Terra aprovada de 1995 que assegura os direitos do povo moçambicano sobre a terra e outros recursos naturais, assim como promover o investimento e o uso sustentável e equitativo desses recursos. No artigo 10, no 3, I série, capítulo iii, da Lei de Terra estabelece que as comunidades têm o Direito de Uso e Aproveitamento de Terra (DUAT) através de um pedido de autorização. Tendo este direito, o artigo 18, capítulo iii, i série, 4º suplemento, nº 27 da Lei de Florestas e Fauna Bravia prevê que as comunidades podem explorar os recursos florestais e faunísticos não para fins lucrativos mas para a satisfação das suas necessidades de consumo e artesanato, com base nas respectivas práticas costumeiras. Portanto, tendo sido reconhecido a importância dos recursos naturais na vida das comunidades, a Política e Estratégia de Desenvolvimento de Florestas e Fauna Bravia, I série, no 14 fomenta a participação comunitária na planificação e programação de actividades que visam o maneio e utilização dos recursos das áreas de conservação sob a sua influência. Por sua vez, o artigo 3, capítulo i, i série, 4º suplemento, nº 27 da Lei de Florestas e Fauna Bravia estabelece que as comunidades locais devem ser envolvidas na gestão dos recursos naturais existentes, desempenhando o papel de parceiros ou colaboradores e que as mesmas têm o direito a um percentual das taxas de exploração correspondente a 20% dos seus recursos. Apesar da participação das comunidades na gestão dos recursos das florestais ter tido alguns resultados positivos em algumas reservas e parques do Zimbabwe e Namíbia, constatou-se que a sua aplicação pelo Ministério da Agricultura e Desenvolvimento Rural especificamente na alçada da DINAC actual ANAC, na reserva de Chimanimani não teve em conta alguns aspectos necessários: (i) O envolvimento efectivo das comunidades na gestão e conservação dos recursos florestais é determinada pela vontade e capacidade dela e não pode ser imposto do exterior (Barrow e Murphree, 2001); (ii) A gestão das reservas nacionais normalmente não é barata, tanto em termos de custo por participante como por unidade por área. A tendência é de apresentarem custos altos como consequência de uma demanda significativa de pessoal com alta qualidade e especialista. Desta forma, as políticas de gestão dos recursos florestais ficam dependentes de fluxos financeiros estrangeiros e as agências doadoras pretendem resultados em curto prazo, quando os mesmos só podem ser alcançados em longo prazo (Adams e Hulme, 2001); (iii) É preciso entender que o envolvimento das comunidades na gestão da reserva não pode ser confundido como um instrumento, pois o envolvimento é um processo e não um resultado. Daí que os objectivos identificados pelas comunidades podem conflituar com os das agências doadoras (Adams e Hulme, 2001); e (iv) É preciso saber distinguir os méritos de intervenção das políticas de desenvolvimento das comunidades que podem contribuir para a melhoria das suas condições de vida e a contribuição delas para a conservação dos recursos florestais. Acredita-se que a conservação com a melhoria das condições de vida das comunidades andam de mãos dadas, porém, as despesas para propósitos de desenvolvimento das comunidades e gestão das reservas podem não dar resultados que são efectivos para a conservação (Adams e Hulme, 2001). Metodologias do trabalho Este trabalho insere-se nas reflexões que procuram analisar a colaboração entre os órgãos locais e as comunidades na gestão pública, sobretudo, a partir de análise do processo de gestão da reserva de Chimanimani. A nossa questão central é, como a convergência entre múltiplos interesses de vários actores pode determinar o sucesso de gestão da política de conservação dos recursos florestais da reserva de Chimanimani? Nesse estudo, utilizou-se vários métodos e técnicas de pesquisa aplicadas nas ciências sociais em geral e na Administração Pública em particular. Foram observados três níveis básicos de estudo: pesquisa bibliográfica, documental e entrevistas semi-estruturadas. Procurando esclarecer o problema de pesquisa, fez-se uma análise bibliográfica, que consistiu na consulta de livros, artigos científicos e revistas on-line que versam sobre a problemática de gestão conjunta da reserva de Chimanimani, em que procura-se compreender o papel das comunidades na preservação e conservação dos recursos florestais, assim como, a actual forma de gestão de Chimanimani e o envolvimento de múltiplos actores na gestão das políticas de conservação. A pesquisa documental consistiu na consulta e recolha de documentos relevantes que abordam sobre os parceiros envolvidos na gestão de projectos que têm em vista a preservação da biodiversidade em Chimanimani, sobretudo de documentos tais como: o Plano Estratégico da Administração Nacional de Áreas de Conservação 2015-2024 e Relatório da I-II-III Reunião Nacional sobre co-gestão de reservas nacionais. A recolha dos destes documentos foi feita no Ministério da Terra Ambiente e Desenvolvimento Rural, Administração Nacional de Áreas de Conservação e Biofund. A revisão de documentos formais serviu de base inicial para traçar pista para a identificação de actores relevantes, assim como os seus interesses. Serviu também para delimitar o contexto de criação de Chimanimani como reserva nacional, os mecanismos de envolvimento das comunidades locais na gestão das políticas de conservação da biodiversidade. Assim como para compreender diferentes estratégias implementadas em parceria com o sector privado para a melhoria na gestão de Chimanimani. Adicionalmente, fez-se pesquisa on-line, particularmente de busca de informação nos portais de duais instituições que trabalham na área de conservação da biodiversidade em Moçambique, sendo a Biofund e o Centro Terra Viva. Foram estudados os Planos de Gestão da Reserva I e II, relatórios, normas de conservação, uma série de documentos que facultaram o entendimento sobre a gestão de Chimanimani, sobretudo, na colaboração entre vários actores na gestão da reserva. Fez-se entrevistas exploratórias para construir a problemática de investigação e elaborar a hipótese, a ideia era na verdade para encontrar pista de reflexão sobre a gestão da reserva de Chimanimani e familiarizar-se com o objecto de pesquisa. Estas entrevistas foram realizadas na cidade de Maputo entre Novembro e Dezembro de 2017, englobando cinco instituições, nomeadamente: Administração Nacional das Áreas de Conservação, Faculdade de Agronomia e Engenharia Florestal da UEM, Biofund, Centro Terra Viva e World Wildlife Fund Moçambique. Foram entrevistados nestas instituições oito funcionários. A nossa pesquisa sendo ela qualitativa, o critério de selecção das instituições e o número de entrevistados foi intencional, pois, são estes que trabalham em assunto de conservação dos recursos florestais em Moçambique. De acordo com Marconi e Lakatos (2010. p. 28) a selecção dos entrevistados para esse tipo de pesquisa é sobretudo, por conveniência dando maior primazia ao pesquisador para definir sua amostra, pois, ele conhece o ambiente natural, isto é, o objecto que está sendo estudado. Essa ideia é secundada por Prodanov e Freitas (2013) que há uma escolha deliberada do pesquisador, e que esta amostra por sua vez, será composta por elementos da população seleccionados intencionalmente pelo investigador, porque este considera que esses elementos possuem características típicas ou representativas da população. O objectivo das entrevistas nesta fase foi de perceber a interacção entre as diversas instituições responsáveis pela gestão da reserva, a relação entre o Estado, o sector privado e os cidadãos na gestão de Chimanimani, a relação entre o défice fiscal e humano do Estado e a gestão de Chimanimani, a lógica de gestão implantada no período de criação de Chimanimani como reserva nacional e a melhoria de gestão da reserva. Realizou-se também entrevistas semi-estruturadas para a verificação da hipótese preestabelecida, estas, decorreram no distrito de Sussundenga no mês de Janeiro de 2018, junto do Administrador de Chimanimani, do chefe do departamento de conservação e desenvolvimento comunitário, do chefe do departamento de fiscalização, do régulo da comunidade de Moribane. Ao todo, foram entrevistados quatros funcionários administrativos de Chimanimani nos escritórios locais, para o caso do administrador da reserva foi nos escritórios da Direcção Provincial da Terra Ambiente e Desenvolvimento Rural da Província de Manica. Definiu-se uma amostra não probabilística por conveniência de quatro funcionários da direcção de Chimanimini por que, foram estes que se encontravam em condições ou capacitados para responder as questões sobre o objecto em estudo em relação a perspectiva de análise definida. O restante de funcionários da direcção de Chimanimini interpelados no dia de entrevista julgava não ter conhecimento sobre o enquadramento das questões com a gestão da reserva, mas que os outros pudessem disponibilizar tal informação. Para as comunidades de Moribane e Maronga optou-se por questionário, concretamente por perguntas fechadas para facilitar a compreensão. Estas foram mais acessíveis, pela proveniência do autor, natural de Sussundenga, o que permitiu nutrir algumas relações interpessoais com as autoridades administrativas locais e as comunidades. Aqui, procurou-se explorar, os mecanismos de envolvimento das comunidades na gestão de Chimanimani, sua participação na gestão e fiscalização dos recursos naturais, interesse iminente das comunidades, seu envolvimento na elaboração das políticas de gestão, o estado actual de gestão da política de conservação da reserva de Chimanimani. O domínio da língua local, “Chitewe”, nos permitiu ter acesso favorecido à informação e estabelecer vínculos com o chefe do posto administrativo de Mpunga, a administração de Chimanimani e as comunidades locais. Enquanto decorriam contactos com estas duas comunidades também colheu-se o posicionamento de treze cidadãos “comuns” nos mercados, nas ruas, nos bares, sobre a actual forma de gestão de Chimanimani estabelecendo contacto com a realidade local e reacções sobre o nosso objecto de pesquisa. A nossa pesquisa é sobretudo qualitativa, procurando a partir da técnica de análise de conteúdo, fazer uma leitura dos dados cruzando as entrevistas, a pesquisa bibliográfica e documental. Esta forma de pesquisa provou ser uma abordagem teórica e empírica de conteúdo articulada para especificar o assunto em tema, definir o problema da pesquisa, elaborar a hipótese e verificar a validade da mesma. A escolha de uma pesquisa qualitativa se fundamentou nas principais características que este tipo de pesquisa apresenta, pois, segundo Godoy (1996, p. 62), apud Oliveira (2008, p. 38) as principais são: (1) ambiente natural como fonte directa de dados, e o pesquisador como instrumento fundamental; (2) carácter descritivo; (3) significado que as pessoas dão às coisas e à sua vida, que deve ser uma preocupação do investigador; e (4) enfoque indutivo. A análise de dados foi feita através de um processo interactivo, incluindo a recolha e análise de conteúdo, verificação da qualidade das informações para análise e mapeamento das interligações entre os actores. Para verificar a validade das informações, os dados das entrevistas foram cruzados com a informação documental para certificar se as mesmas expressavam ideias consistentes e posições assumidas dos intervenientes. Limitações de pesquisa Entre outras limitações para a elaboração deste trabalho, a maior foi o processo burocrático para fazer entrevistas as comunidades de Moribane e Maronga. A outra foi o receio das comunidades em disponibilizar informação relativa a gestão de Chimanimani, sob alegação de ser uma matéria “perigosa”. Uma das estratégias usadas para colmatar estas limitações foi de clarificar ao régulo de Moribane que a finalidade das entrevistas era para compreender a colaboração entre as comunidades e a direcção de Chimanimani, se participam nas reuniões comunitárias sobre conservação da biodiversidade da reserva e o que gostariam que melhorasse na gestão da reserva. Só através dessa informação, que o régulo facultou uma guia que fui carimbar no posto administrativo de Mpunga e um responsável de fiscalização para acompanhar nas actividades dentro da comunidade. A companhia do fiscal Robate Macunda da comunidade de Moribane deu confiança e abertura aos residentes para disponibilizar a informação e prosseguisse com a actividade que se pretendia. PARTE I: ESPAÇO E INTERACÇÕES DE ACTORES NA RESERVA NACIONAL DE CHIMANIMANI Nesta parte do trabalho discutimos as dinâmicas de criação da reserva de Chimanimani entanto que um espaço que congrega variados actores com diversos interesse. O objectivo fundamental de tal exercício é de apreender de forma perspicaz as modalidade de gestão, os conflitos e dissonâncias resultantes quanto aos pressupostos iniciais de criação da reserva. Capítulo I: Chimanimani como reserva e espaço de conflito de interesses 1.1. Antecedentes históricos de criação de Chimanimani A criação de Chimanimani foi precedida por três acontecimentos fundamentais: a aprovação da legislação sobre o uso da terra, na gestão das políticas florestais e nas formas de gestão das áreas de conservação. Com a independência em 1975, o governo da Frelimo adere ao regime socialista que aboliu a propriedade privada passando tudo para o Estado e se introduziu novas formas de administração do território, desfazendo-se ou excluindo-se o sector privado, as ONG’s, os líderes comunitários e as comunidades locais. A necessidade de recuperação das áreas de conservação “abandonadas” durante as guerras que o país enfrentou, possibilitou um maior estreitamento das relações entre o Banco Mundial e o Governo moçambicano com vista no desenvolvimento da reserva nacional de Chimanimani, sobretudo no âmbito da gestão dos recursos faunísticos e florestais, sobretudo de preservação da biodiversidade da reserva . Nesse contexto, foi aprovado o projecto de criação de Chimanimani com um valor total de 8,1 milhões de dólares destinados a implementação e para o reforço institucional, cujos objectivos eram de desenvolver políticas que criassem um ambiente institucional adequado a reabilitação, conservação e gestão dos recursos naturais existentes em Moçambique em geral (José, 2007). Em finais de 1996 é lançado o projecto e as actividades tiveram início em 1997. O Banco Mundial, através do Global Environment Fund financiou a implementação do projecto de criação de Chimanimani. Contudo, o fundo alocado para as actividades de criação de Chimanimani não era suficiente (José, 2007. p. 35). Como forma de dar andamento normal das actividades do projecto, o governo provincial de Manica recorreu à Fundação Ford para à angariação de fundos que permitissem o andamento das actividades. Os principais problemas enfrentados para a implementação do projecto de criação de Chimanimani foram os seguintes: (i) partes da área encontravam-se minadas, pois a floresta de Moribane albergava a base militar da Renamo; (ii) os membros da comunidade de Moribane não aceitavam nenhuma proposta trazida pelo projecto, associavam-na a uma iniciativa da Frelimo, governo no poder, que tinha pretensões eleitorais; (iii) os régulos não permitiam a entrada de meios de transporte; (iv) não concordavam com a construção de infra-estruturas que não usassem o material local (Matos, 2011. p. 110). O período entre 1997 a 2009 foi marcado pela aprovação de legislação e estratégias que visavam fortalecer o quadro jurídico ambiental, bem como a reabilitação e declaração de novas áreas de conservação. Foi igualmente nesse período, em que foi aprovada pela Assembleia da República a Constituição de Moçambique de 2004. A CRM contém as bases da organização do Estado moçambicano, dentre os quais podemos encontrar referências aos mecanismos para a defesa e protecção do meio ambiente (Simbine, 2002. p. 208). Para regular a matéria sobre o meio ambiente, foi aprovada a lei do ambiente em 1997, Lei n.º 20/97, de 1 de Outubro que estabelece os princípios básicos gerais da política ambiental, a utilização e gestão racionais dos componentes ambientais de forma a promover a melhoria da qualidade de vida dos cidadãos. Para regular assunto de terra num período em que se verificava a fixação de residências dentro das áreas de conservação (Parques e Reservas Nacionais), prática de agricultura de subsistência, contrabando de madeira, entre outros factores, foi aprovada a Lei n.º 19/97, de 1 de Outubro para regular a situação de Terras. Em 1999, o crescente desflorestamento em maioria dos parques e reservas nacionais ganha atenção do Conselho de Ministros que veio a aprovar a lei de florestas e fauna bravia, a Lei n.º 10/99, de 7 de Julho, determina no seu artigo 2 que a mesma define os princípios e normas básicas sobre a protecção, conservação e utilização sustentável dos recursos florestais e faunísticos no âmbito de uma gestão integrada, com vista ao desenvolvimento socioeconómico do país. Para avaliar o impacto ambiental, foi aprovado em 2008 o Regulamento sobre o Processo de Avaliação do Impacto Ambiental, bem como o Decreto n.º 42/2008, de 8 de Novembro que estabelece os procedimentos e condições para o licenciamento ambiental e classifica as actividades e os impactos que podem ser causados dependendo do bem em causa em categorias, determinando em consequência a necessidade de um estudo de impacto ambiental. Já, em 2009, devido ao conflito entre o Homem e a Fauna Bravia, foi aprovada a Estratégia de Gestão do Conflito Homem/Fauna Bravia, a Resolução n.º 68/2009, de 29 de Dezembro que define os mecanismos de conservação, as medidas de prevenção de conflito e avança com propostas de categorias de áreas de conservação do domínio público e um plano de uso da terra e de reassentamento da população. No mesmo ano foi criado um instrumento integrado sobre a conservação da biodiversidade, a Resolução nº 63/2009, de 2 de Novembro que veio apresentar propostas para uma estratégia orientada nas reformas a serem efectuadas na área da conservação. Com as reformas instituídas no quadro legal do sector de conservação, estavam criadas as condições para o envolvimento das comunidades locais na gestão da reserva nacional de Chimanimani que culminaria com a melhoria de condições de sobrevivência das comunidades. Porém, apesar de todas as legislações darem importância ao papel das comunidades locais, o conflito de interesse sobre os recursos naturais de Chimanimani perigava a gestão eficaz da reserva. Portanto, se um dos princípios da gestão da reserva nacional de Chimanimani é reconhecer o poder das comunidades locais sobre as formas de gestão e exploração dos recursos existentes nas suas terras, este reconhecimento fica fragilizado. Isto por que, as comunidades apenas se tornam hospedeiras de investimentos externos nas suas áreas de conservação e contentando-se com os 20% que lhes é alocado conforme está previsto na legislação . Com este cenário, fica a ideia de que apesar das legislações destacarem a importância de envolvimento das comunidades locais no processo de gestão das políticas de conservação da biodiversidade em Chimanimani, observa-se que esse envolvimento é bastante limitado. Também, transparece que, o objectivo com a aprovação da legislação nesse período era de abrir as portas para os investidores, quer nacional como internacional, para a exploração da riqueza natural existente na reserva. 1.2. Criação de Chimanimani como reserva nacional A história de conservação é recente no contexto moçambicano, tendo-se iniciado os primeiros passos para a conservação da flora na década de 1950 do século XX, quando foram criadas as primeiras áreas de preservação denominadas reservas florestais. A criação de reservas florestais nos anos 1950 foi o primeiro passo dado pela administração colonial portuguesa, no sentido de se restringir o uso de determinados recursos naturais pelas comunidades locais. Segundo Brouwer (2006) a preocupação com a criação de Chimanimani deveu-se ao facto de: (i) a floresta ser o espaço de preferência do camponês para a prática da agricultura (no ciclo de corte e queimadas) e ao mesmo tempo, espaço de refúgio dos camponeses expulsos das suas terras no âmbito da guerra civil; e (ii) ser fonte de produtos e serviços tanto para a comunidade local como para os interesses empresariais, pois a população recorria à floresta para a obtenção de plantas medicinais, frutos, caça, obtenção de material de construção e combustível, enquanto as empresas convertiam-nas em áreas de produção agrícola (plantações) ou exploravam-na directamente (extraindo madeira e organizando safaris). A criação de Chimanimani foi largamente influenciada por vários doadores internacionais e por organizações não-governamentais, tais como o Banco Mundial, União Internacional para a Conservação da Natureza (UICN) e a Fundação Ford com interesses diferentes (Virtanen, 2005. p. 357). A diversidade de interesse entre os doadores sobre a criação de Chimanimani estava ligada a dinâmica e visões diferentes de conservação da biodiversidade, causadas sobretudo pelo avanço da fronteira de exploração comercial da madeira e da exploração dos recursos naturais para à subsistência das comunidades locais (Tornimbeni, 2007. p. 485). Para o início da criação de Chimanimani como uma reserva nacional foi necessário um processo de sensibilização das comunidades locais sobre as pretensões do governo com a área. Para tal, foram mobilizados vários actores com vista a preparar a área para à introdução das novas formas de gestão sustentável das áreas florestais e mudanças de alguns hábitos locais, dentre os actores, destacam-se: Organização para o Empoderamento da Mulher Rural (AMRU) responsável pela formação, implementação, monitoria, avaliação e comercialização do mel das comunidades; Organização Rural de Ajuda Mútua (ORAM), que teve a função de divulgar as legislações relacionadas com o uso da terra e dos recursos naturais. Coordenou a criação de associações, sua legalização e formou os comités locais de gestão: Grupo de Educação Social de Manica (GESOM) e Programa de Activistas Culturais (PAC) estiveram ligados as questões de educação cívica das comunidades, dando maior enfoque para as questões relacionadas com o uso sustentável e conservação dos recursos naturais; Instituto Agrário de Chimoio (IAC) e Global Environment Facility (GEF) estiveram encarregadas de realizar pesquisa na área florestal. CEF ficou responsável do projecto na reserva florestal de Moribane, onde tinha os seus campos de ensaios. Planificava, controlava, executava as actividades e monitorava as actividades (Tatakala e Mushove, 2001). A pesar desse processo preparatório levado acabo por esses actores, as comunidades locais não foram favoráveis quanto ao processo de criação de Chimanimani, por que o contacto que mantinham com o vizinho país do Zimbábwe lhes permitiu acompanhar o processo de exclusão das comunidades locais das suas áreas com a criação do Parque Nacional de Chimanimani do lado do Zimbábwe . Desta forma, desde o começo da realização das actividades de criação de Chimanimani, as comunidades mostraram resistência à sua concepção (Matos, 2011). A Reserva Nacional de Chimanimani foi criada 2003 através do decreto no 34/2003, de 19 de Agosto, constituído por cinco áreas ecológicas distintas da reserva: Moribane, Maronga, Zomba, Mahate, e Tsetsera. De acordo com a Política de Conservação (2009) a Reserva de Chimanimani é uma área de conservação que é parte de uma região ecológica que atravessa fronteiras de dois países (Moçambique e Zimbábwe) envolvendo mais de uma áreas de conservação e áreas de uso múltiplo dos recursos. 1.3. Chimanimani em busca de um modelo de gestão A preocupação com a criação de um modelo de gestão das áreas de conservação que envolve doadores, ONG’s, sector privado e comunidades data do final dos anos 1990, resultado de várias políticas e estratégias tais como: Política e Estratégia de Desenvolvimento de Florestas e Fauna Bravia (1997), Plano Estratégico para o Desenvolvimento do Turismo em Moçambique (2004), Princípios para à Administração das Áreas Protegidas em Moçambique (2006). Autores como Bila e Salmi (2003) e mais particularmente Ferrão (2004) e Cistac (2004) abordam este assunto e recomendam ao estabelecimento de uma agência autónoma para optimizar a gestão das áreas de conservação e garantir a participação das comunidades locais, da sociedade civil e do sector privado. Estes autores abordam o assunto na perspectiva de se criar uma agência autónoma para cada reserva e parque nacional e uma outra agência que poderia se localizar na capital do país, sendo que as agências que actuariam em cada uma das reservas prestariam conta à agência nacional de gestão. Ora, Chimanimani está a ser gerida pela Administração Nacional das Áreas de Conservação, abreviadamente designada por ANAC, criada em 2011 pelo Decreto n.º 11/2011, de 25 de Maio, entidade sob tutela do Ministério da Terra, Ambiente e Desenvolvimento Rural (MITADER). ANAC é uma entidade pública dotada de personalidade jurídica e autonomia administrativa, financeira e patrimonial com a preocupação de garantir uma gestão eficaz e sustentável das áreas de conservação. Antes da reserva de Chimanimani ser gerida pela ANAC em 2011, estava sob gestão do Ministério do Turismo através da Direcção Nacional das Áreas de Conservação (DNAC) para responder pela gestão da maior parte das áreas de conservação existentes no país. Assim, as suas funções estão estabelecidas no artigo 4 do Diploma Ministerial n° 126/2000 de 13 de Setembro: em que coordena as acções de exploração das áreas de conservação; apresenta propostas para a criação de novas áreas de conservação; aprovam os planos de maneio e os itinerários nas áreas de conservação e velar pelo seu cumprimento. Com a criação da ANAC em 2011, buscava-se neste caso criar um sistema unificado para a conservação e que envolvesse a transferência das responsabilidades pela conservação ao nível nacional para uma única entidade. Neste sentido, o seu objectivo seria de conservar a diversidade biológica dentro do Sistema Nacional das Áreas de Conservação, garantir o uso sustentável das áreas de conservação, desenvolver infra-estruturas de gestão e para o desenvolvimento de actividades económicas e, estabelecer parcerias para a gestão e desenvolvimento das áreas sob a sua gestão. Cabe neste caso a Administração Nacional das Áreas de Conservação, através do seu Conselho Directivo deliberar as contratações de empréstimos junto das entidades públicas e privadas; autorizar as actividades condicionadas nas áreas de conservação, tendo em atenção o respectivo plano de maneio e demais legislação aplicável; aprovar as normas e procedimentos administrativos e financeiros da ANAC. Ainda na óptica de gestão de Chimanimani por uma só entidade, foi instituída um Conselho de Gestão das Áreas de Conservação para apoiar as actividades da Administração Nacional das Áreas de Conservação ao nível local. Portanto, é um conselho constituído por representantes das comunidades locais, do sector privado, das associações e dos órgãos locais do Estado, sob supervisão da ANAC. Ao nível local, o Conselho de Gestão das Áreas de Conservação apoia a ANAC na (i) implementação de planos de maneio; (ii) fiscalização das áreas de conservação; (iii) respostas às necessidades de melhoria de condições de sobrevivência das comunidades que legalmente residem nas áreas de conservação e nas zonas tampão (SAL & Caldeira, 2014. p. 30). “A fiscalização da reserva de Chimanimani, esta actividade é exercida por fiscais do Estado, agentes comunitários e fiscais ajuramentados, incluindo as forças de defesa e serviços de segurança do Estado” . Assim, o acesso e utilização de recursos naturais de Chimanimani são feitos mediante taxas. O pagamento dessas taxas visa a compensação ao esforço da conservação e pelos serviços ecológicos da reserva de Chimanimani. É o Conselho de Ministros que fixa os valores das taxas, bem como a emissão de licença para o exercício de actividades de exploração e demais autorizações, incluindo as sobretaxas do repovoamento. As comunidades locais beneficiam de percentagens dos valores provenientes das taxas de acesso e utilização de recursos em valores não inferiores a 20%. Por sua vez, as comunidades locais são isentas do pagamento de taxas pela utilização dos recursos naturais, desde que os utilizem para fins não comerciais e em áreas que tais actividades sejam permitidas, como o caso da “zona de tampão” . No entanto, pode surgir um pensamento sobre o qual entre a visão performativa de gestão co-participada e a sua efectivação no quotidiano da administração de Chimanimani está imbuída de dissonância e contra factos do previamente imaginado. Aliás, como apregoam muitos estudos sobre processo de implementação, Hill e Hupe (2002) e Lipsky (2010) o sucesso de uma política pública não está na visão estratégia dos formuladores das políticas, nem nos objectivos que pretendem alcançar a médio ou longo prazo, mas sim, nas dinâmicas entre as formulações, os jogos de implementação e apropriação ao nível da base. Aliás, no final do dia, quem faz a política de conservação da biodiversidade da reserva de Chimanimani e torna-la bem-sucedida são funcionários que trabalham directamente com as comunidades, os fiscais, ou seja, os agentes de interface com o público-alvo. Portanto, a política de conservação entendida aqui como a gestão da reserva de Chimanimani pode ser concretizada através da articulação entre a administração da reserva, outros agentes públicos e privado e o envolvimento da comunidade local no dia-a-dia Capítulo II: actores, interesses e representação na gestão de Chimanimani 2.1. O papel de diferentes actores na gestão de Chimanimani Mapa 1. Mapeamento Dos Actores Na Gestão De Chimanimani Em 2011, Moçambique viveu um período de reforma institucional, que culminou com a criação da Administração Nacional das Áreas Conservação, dedicada exclusivamente à conservação, supervisionado ao mais alto nível para garantir uma melhor coordenação e concertação de interesses sectoriais. Assim, o Estado reconhece a necessidade de envolver outros actores e parceiros que actuam de forma independente ou em colaboração, sendo entre eles: Legenda Actores locais Actores do nível central Actores internacionais Actores provinciais Fonte: elaborado pelo autor A figura 1 elucida os actores presentes na gestão de Chimanimani concentrados principalmente, ao nível local, provincial, central e internacional, que olham para à reserva de Chimanimani não só como um espaço de conservação e preservação da biodiversidade, mas como, um espaço propício para o desenvolvimento do ecoturismo. Gestão de Chimanimani e actores internacionais Os actores localizados ao nível internacional, denominados doadores têm o o papel de definição de mecanismos e estratégias de conservação da biodiversidade ou seja, ditam as acções a serem desencadeadas e disponibilizam os fundos monetários necessários para processo de gestão. Os fundos disponibilizados por estes actores é para tornar Chimanimani numa zona de atracão turística, com isso, concebe-se que o desenvolvimento de ecoturismo como actividade que garante o envolvimento de vários actores. Gestão de Chimanimani e actores centrais Os actores localizados ao nível central, encontram-se os actores estatais que têm o papel de implementação, monitoria e avaliação das acções definidas pelos doadores. Estas acções têm como consequência a reestruturação, tanto da reserva, como das relações que se estabelecem a nível local. Para apoiar a conservação e a gestão sustentável dos recursos naturais e da biodiversidade aquática e terrestre, incluindo a consolidação do Sistema Nacional das Áreas de Conservação foi criada em 2011 a Biofund. Este actor central traz ao esforço da conservação em Chimanimani, o contributo do sector privado e da sociedade civil a partir do desenvolvimento do ecoturismo, uma actividade considerada menos impactante ao ambiente (Eagles; Mccool; Haynes, 2002). Portanto a maior das organizações, públicas e privadas, ligadas à conservação da biodiversidade são membros da Biofund entre eles: o Centro Terra Viva (Maputo cidade), Fundação Micaia, Associação Cubatana Moribane (distrito de Sussundenga, respectivamente), entre outras . Gestão de Chimanimani e actores provinciais O actor localizado ao nível provincial, representado pela Direcção Provincial de Terra Ambiente e Desenvolvimento Rural da Província de Manica (DPTADRPM) é o segundo centro de convergência das acções, pois neste nível também se encontram os representantes dos actores estatais e das ONG’s. O papel do actor provincial é sobretudo a execução e monitoria da política de gestão da Reserva de Chimanimani, de modo a reportarem, para os actores centrais. Apesar da cidade de Chimoio ser o segundo centro de importância na hierarquia de definição e execução das políticas de gestão de Chimanimani, constata-se que é nela onde as repercussões são maiores, pois, este actor está em contacto com as comunidades locais, Fundação Micaia, Associação Cubatana Moribane e Associação dos verdes de Tsetsera e muitas vezes, são eles responsabilizados pelo fracasso ou sucesso da política de gestão da reserva de Chimanimani. Gestão de Chimanimani e actores locais Os actores localizados ao nível local têm o papel de capacitar, preparar e organizar associações locais de modo a concorrerem aos fundos disponibilizados pelos investidores: Banco Mundial e USAID. Estes actores materializam também os projectos de desenvolvimento ecoturísticos, assim como actividades viradas para a educação cívica das comunidades, dando maior enfoque para as questões relacionadas com o uso sustentável e conservação dos recursos naturais. Apesar dos actores estarem localizados em vários níveis de actuação, constata-se que os actores do nível central, representados pela Administração Nacional das Áreas de Conservação na cidade de Maputo, é a que concentram os actores com os níveis de poder e gestão mais significativos que os restantes. Alguns actores do nível internacional, o Banco Mundial e USAID têm os seus representantes a nível central na cidade de Maputo, logo, é neste nível onde converge a definição da política de gestão de Chimanimani. Como é sublinhado abaixo: “Participo sim em reuniões. É através das reuniões que influencio as medidas de conservação da biodiversidade na reserva e sinto que a minha opinião está sendo escutada ou não. As reuniões são o memento que as comunidades se expressam e interagem com a administração da reserva sobre as formas de gestão dos recursos”. (Mateus Elias Machate , Membro de comité de gestão da área de Moribane Portanto, são na verdade estas reuniões comunitárias que saem as ideias para aprovação ou revisão da política de conservação da biodiversidade da reserva de Chimanimani, ou seja, as discussões que ocorrem com as comunidades nas reuniões sobre a problemática de gestão da reserva servem de base para aprovação de estratégia de melhoria de gestão de Chimanimani. Para além de serem capacitadas como guias turísticas, assim como actores de aconselhamento e educadores em matéria de conservação do ecossistema de Chimanimani. 2.2. Mecanismos de coordenação e gestão de Chimanimani A relação que se estabelece entre os actores na gestão de Chimanimani é de dependência para a efectivação da política de conservação. Esta relação na verdade não é simétrica, mas sim assimétrica, e muitas vezes, com uma única direcção. Para ANAC materializar as acções definidas pelos investidores depende do Orçamento do Estado e do investimento do Banco Mundial e da USAID. Para que a DPTADRPM desenvolva suas actividades ao nível local depende do Orçamento do Estado. Por fim, para que a Fundação Micaia e a Associação Cubatana Moribane prossigam as actividades ecoturísticas precisam do investimento do Banco Mundial e tendo estabelecido parceria com o sector privado. A posse dos fundos financeiros, dita, de certa forma, as acções de gestão de Chimanimani pelos restantes actores, isso permite com que a dominação dos doadores seja orientada em função daqueles que possuem os fundos, tornando os restantes actores executores. Portanto, é o Banco Mundial e a USAID que influenciam as actividades a serem desenvolvidas pela ANAC e Biofund. Às comunidades apenas lhes restam à obediência das acções, sob o pretexto de que a gestão de Chimanimani poderá melhorar as suas condições de sobrevivência. A participação da Direcção Provincial de Terra Ambiente e Desenvolvimento Rural da Província de Manica apesar de transportarem consigo o discurso de “participação de múltiplos actores” e melhoria das condições de sobrevivência das comunidades, constata-se que no geral, a finalidade era de preparar o substrato para à introdução de uma lógica de funcionamento de Chimanimani que respondesse aos anseios ou interesses dos doadores, tanto como, era uma das suas exigências para financiarem o projecto de gestão. Como podemos ver na entrevista abaixo: “Para a materialização das actividades que tem em vista atrair turistas na região e consequentemente alcançar os objectivos do Plano Estratégico do Turismo dependemos do apoio financeiro e a participação do sector privado”. . A dependência das agências do governo dos fundos externos faz com que a sua intervenção, por mais que seja a mais bem intencional, apresente-se limitada e, de certa forma, controlada por quem financia as suas actividades. A falta de poder monetário faz com que o papel da Administração Nacional das Áreas de Conservação e da Biofund seja fragmentado e se submeta à filosofia de políticas de gestão dos doadores. PARTE II: MEDINDO O DESEMPENHO DA POLÍTICA DE GESTÃO DE CHIMANIMANI Nesta parte vamos discutir diferentes estratégias de gestão integrada de Chimanimani, mostrando, sobretudo a relevância de gestão da reserva por diferentes entidades para melhoria de Chimanimani. O objectivo é analisar o desempenho das estratégias para uma gestão mais sustentável da reserva. Vamos descrever o desenvolvimento do ecoturismo na região como alternativa para a gestão de Chimanimani. Ainda nesta parte, vamos demonstrar a redução da dependência das comunidades aos recursos da reserva através de benefícios que visam melhorar as suas condições de sobrevivência como uma forma de alcançar uma gestão eficaz e efectiva de Chimanimani. Capítulo III: Ecoturismo inclusivo e a convergência de interesse entre múltiplos actores na gestão da reserva 3.1. Co-gestão na gestão de Chimanimani: um exercício complexo? Moçambique tem estabelecido ao longo dos anos, diferentes iniciativas de gestão colaborativa com entidades privadas e a comunidade local, como forma de partilhar responsabilidades de gestão da biodiversidade. Da parceria entre a BIOFUND e a USAID iniciaram actividades que visam melhorar a qualidade de gestão das Áreas de Conservação em Moçambique no geral e Chimanimani em específico. A co-gestão de Chimanimani significaria portanto, que a gestão dos recursos da reserva fosse feita mediante a divisão dos produtos, responsabilidades, controle e autoridade de decisão entre comunidades locais, o sector privado, ONG’s e a direcção de gestão de Chimanimani. Porém, esse envolvimento das comunidades na gestão de Chimanimani depende dos níveis de rendimento individual e familiar; dos sistemas de uso de terra estabelecido pelo Estado e pelos direitos consuetudinários e da mobilidade das comunidades nas áreas em que se encontram. A gestão conjunta de Chimanimani tem vantagem, na medida em que marca o início de uma nova era de gestão das áreas de conservação permitindo a partilha de responsabilidades entre os principais actores nomeadamente: doadores, o sector público e privado, ONG’s e comunidades na mobilização do capital financeiro, assim como do capital humano globalmente disponível; oportunidade de desenvolvimento do turismo como força motor para a geração de receitas com vista ao alcance da sustentabilidade ecológica e económica da reserva. Para que as comunidades locais se envolvam activamente na gestão de Chimanimani, é preciso que se ratifique oficialmente os direitos de acesso e uso dos recursos naturais existentes na reserva, isto porque a Lei de Terra de 1997 e a Lei de Florestas e Fauna Bravia de 1999 não toleram a existência de assentamentos humanos, porém, o contexto económico e social não é favorável à sua aplicação, na medida em que as comunidades são dependentes dos recursos naturais da reserva de Chimanimani para garantir a sua sobrevivência. Portanto, o envolvimento das comunidades, sector privado, ONG’s e doadores é uma das forma mais adequadas de gestão de Chimanimani, na medida que o Estado não possui recursos financeiros e humanos suficientes para gerir, como dizia um funcionário do departamento de conservação da Reserva de Chimanimani: “O número de trabalhadores da Reserva de Chimanimani está longe de responder aos actuais desafios que se enfrentam, principalmente de invasão dos desempregados Zimbabwianos para exploração da mineração na área. Por isso, estamos a fazer uma campanha de sensibilização das comunidades para fiscalizarem e denunciarem a exploração ilegal dos recursos da reserva” . “Estamos a fazer esforço de envolver as comunidades locais na gestão de Chimanimani para serem fiscais, até então são 7 trabalhadores da comunidade deixando de fora os 5 régulos de cada uma das comunidades que integram a reserva” . Perante estes desafios para a gestão eficaz da reserva de Chimanimani evidenciam a necessidade de valorização e aplicação dos mecanismos de tomada de decisão que caracterizam as comunidades, o sector privado e as ONG’s. Reconhecer o papel destes actores sem incorporar seus mecanismos de gestão pode limitar o sucesso das políticas de conservação da biodiversidade da Reserva de Chimanimani, pois o seu funcionamento pode não ter uma aceitação significativa, podendo não ser apropriado pelas comunidades locais. 3.2. Desenvolvimento do ecoturismo como estratégia de melhoria da gestão de Chimanimani A introdução do ecoturismo como a principal actividade económica, social e sustentável em Chimanimani foi uma estratégia encontrada pelo Banco Mundial em 2014 para melhorar a gestão da reserva, sendo uma poderosa ferramenta para a conservação de áreas protegidas e para o desenvolvimento de uma consciência ambiental de residentes e visitantes. Esta actividade ecoturística apresenta-se como uma forma eficaz de gestão de Chimanimani por fazer uma aliança perfeita entre a conservação e a economia, podendo beneficiar, principalmente as comunidades locais através da criação de postos de trabalho. Segundo o presidente da associação Micaia: “O Banco Mundial financiou a construção de infra-estruturas, vias de acesso, um “tender camp’ localizado a beira do rio Nhamazi e um “advance central”. Um espaço de aventura para atrair jovens, principalmente jovens da escola secundária e universitários num valor de 300 mil dólares americanos. Estes fundos monetários são geridos pela associação Micaia/Manica”. (Milagre Nuvunga , presidente da associação Micaia/Manica). A ideia de desenvolvimento do ecoturismo como estratégia para melhorar a gestão de Chimanimani passa sobretudo por envolver vários actores para implementar projectos que criam benefício para manutenção da reserva, assim como dotar Chimanimani de recursos modernos de gestão atractiva aos turistas e melhorar as condições de sobrevivência das comunidades. A associação Micaia/Manica é um dos actores locais influentes na coordenação de parcerias com as autoridades administrativas locais, organizações não-governamentais, o sector privado, os doadores e as comunidades locais. Assim, assume-se que é necessário dotar a reserva de Chimanimani de condições de infra-estruturas para acolher turistas. O investimento usado apenas para melhorar as infra-estruturas, vias de acesso e restaurantes nas áreas de conservação, pode não surtir efeitos positivos, pois o número de turista que podem se deslocar para estas áreas pode não ser suficientes para suportar os custos de operação, bem como para garantir a efectivação da gestão das reservas (Matos, 2011). A administradora da reserva segundava esta informação dizendo que: “O número de turistas é muito reduzido, olhando para o potencial de atracção turística que Chimanimani tem, 20 turistas por ano é quase nada. Enquanto o parque Zimbabweano com o mesmo nome é mais visitado por turista” . A mesma ideia é partilhada pelo actual administrador: “O desenvolvimento do ecoturismo está muito fraco em Chimanimani, com regiões aparentemente virgens para à exploração turística, entre 2014-2017 a média de turistas que visitaram Chimanimani foi de 17 à 20 por ano, e na sua maioria são turistas provenientes da Inglaterra, EUA, Brasil, Suíça, Canadá, Eslovénia” . Jaime (2015) vê a necessidade de apostar mais no marketing ecoturístico para atrair mais turistas para a região de Chimanimani, como também no sector privado, ONG’s e doadores para investirem não só na melhoria de infra-estruturas e qualidade dos serviços mas também na preservação de ecossistema, riquezas arqueológicas, biodiversidade de animais e plantas. A presença de diversos actores no desenvolvimento do ecoturismo não só garantiria o emprego e aumento de renda das comunidades locais, como também fortificaria as relações entre os actores envolvidos e consequentemente melhoraria a gestão de Chimanimani. Contudo, até então, esse crescimento apenas beneficia os agentes económicos que estão directamente ligados a exploração de hotéis e restaurante e, os que estão concentrados em destinos turísticos tais como: montanha Binga, pinturas rupestres de Chikukwa, ponte de Deus em Moribane e membros das comunidades locais só se beneficia como guias turísticas. Face a isso, Matos (2011) argumenta que há necessidade de tornar o turismo numa actividade inclusiva, que esteja alicerçada não só na gestão integrada de Chimanimani mas também no desenvolvimento local. Capítulo IV: Da dependência de interesses das comunidades para melhoria de gestão de Chimanimani 4.1. Mecanismos de redução da dependência das comunidades como estratégia de gestão de Chimanimani A dependência das comunidades em relação aos recursos de Chimanimani é maior e, a preocupação com a gestão da reserva de Chimanimani parece sobressair mais que as questões de desenvolvimento das comunidades (Matos, 2011). Das entrevistas com as comunidades e autoridade administrativa local, constatou-se que a preocupação com a gestão de Chimanimani está ligada, principalmente, com a abertura de novos campos de cultivos, à caça furtiva e o corte ilegal de árvores cujo objectivo é de melhorar as condições de sobrevivência das comunidades. Ora, uma das estratégias usada pelo Ministério da Terra, Ambiente e Desenvolvimento Rural (MITADER) para a redução da dependência das comunidades foi o fomento da produção de mel, colecta de cogumelos, piscicultura, distribuição de variadas sementes hortícolas e a comercialização do excedente agrícola. Segundo, José (2007) a exploração da produção de mel teve apoio de uma organização alemã que se dedicou em pesquisar o potencial da área. A produção de mel em Chimanimani está sendo gerida pela BIOFUND e Administração Nacional de Áreas de Conservação (ANAC) através do Projecto de Áreas de Conservação para Biodiversidade e Desenvolvimento (MozBio) com uma vigência de 4 anos (2015-2018). Assim, os actores envolvidos na aprovação desse projecto foram o Governo de Moçambique e o Banco Mundial, que também canalizaram através da BIOGUND os custos operacionais, no total de cerca de 3 milhões de dólares americanos. Segundo o director geral da ANAC: Actualmente, existe uma crescente demanda de mel tanto no mercado nacional como internacional que viabiliza o desenvolvimento da apicultura em moldes comerciais. De acordo com dados do mercado, o mel de Chimanimani está entre os melhores produzidos em Moçambique neste momento . Em 2016, a Mozambique Honey Company, Lda (MHC), comprou cerca de 14 toneladas de mel proveniente da Reserva de Chimanimani. O dinheiro da venda do mel de Chimanimani foi usado para melhorar as condições de sobrevivências das comunidades dentro e à volta da Reserva, sobretudo para fortificar a gestão de Chimanimani. Para Matos (2011) a produção de mel tinha como objectivo melhorar a gestão da reserva através da mudança dos hábitos de uso dos recursos de Chimanimani pelas comunidades para uma forma de gestão mais eficaz e efectiva. Outra actividade desenvolvida em Chimanimani foi a colecta de cogumelos para comercialização. O Governo pretendia com o projecto incentivar o consumo nas comunidades, para que não continuem a desenvolver actividades como expansão dos campos agrícolas, corte ilegal de troncos, actividades que afectam a gestão da reserva. Só que este projecto não chegou a se concretizar devido a exigência de qualidade no mercado internacional. José (2007) complementa que outros factores do fracasso do projecto foram: a falta de investimento suficiente e de pessoal técnico para garantir o andamento normal do projecto. Não foram comprados os equipamentos necessários para a secagem do produto e para a sua conservação. Diferentemente do projecto de incentivo de consumo de peixe que os resultados são visíveis, como é o caso do mercado de peixe no posto administrativo de Dombe-sede. Apesar do consumo de peixe não far-se-ia parte dos hábitos alimentares dessa comunidade (Simbine; Folowa e Nhussi, s/d). Chimanimani apresenta condições favoráveis para a introdução da piscicultura. Esta actividade foi introduzida com pretensões de ser uma alternativa de fonte de proteína para as comunidades e os excedentes são colocados nos mercados locais. Esta actividade foi apenas introduzida na comunidade de Moribane (José, 2007). Como testemunhava um dos benificiários: “Para criação da piscicultura, tive o apoio da administração do distrito de Sussundenga, eles disponibilizaram todo material e participei numa capacitação sobre produção e conservação de peixe. Várias comunidades vêm comprar peixe aqui em Dombe porque está barato e com o dinheiro sustento minha família” . Mónica Chingore, residente da comunidade de Moribane. O pressuposto de criação e consumo de peixe na comunidade de Moribane é desenvolvido tendo em vista a sua empregabilidade de modo a não praticar actividade que destruem o ecossistema e a biodiversidade da reserva. Nesse caso, é uma actividade que procura aproximar a comunidade aos objectivos da política de gestão da reserva de Chimanimani. 4.2. Desenvolvimento das comunidades através da gestão de projectos locais em parceria com o sector privado Como forma de garantir o desenvolvimento das comunidades e a gestão de Chimanimani por diversos actores, viu-se a necessidade de reabilitação e abertura de novas estradas, doação de moagens para cada comunidade e o investimento de 10 mil meticais pela USAID que foram investidos na compra de produtos para abertura de cantinas. Estas actividades, directa ou indirectamente, contribuíram para à conquista de confiança nas comunidades sobre um futuro risonho, que está alicerçado numa gestão integrada de Chimanimani. Assim, para a efectivação de gestão integrada de Chimanimani foram realizados acordos e contractos com a Fundação Micaia/Manica, Amero, IP Consultores e Acuesa Simusai que trabalharam como facilitadores das comunidades, capacitando-as e potenciando-as na gestão eficaz da reserva, isto é, preparam e organizaram comunidades em associações locais de modo a concorrerem aos fundos disponibilizados pelo USAID e Banco Mundial. A maioria dos projectos desenvolvidos em Chimanimani é de infra-estrutura turística com arquitectura adaptada ao meio ambiente, geridos em parceria com o sector privado, com a finalidade de garantir o desenvolvimento das comunidades, consequentemente melhorar a gestão de Chimanimani, sobretudo nas seguintes áreas: 1) empreendimento turístico; 2) produção e venda de mel; 3) capacitação e ou formação de guias turísticas; 4) e outros negócios, com destaquem para a introdução da agricultura de conservação. Assim, com o objectivo de melhorar a gestão de Chimanimani, construiu-se um lodge na comunidade de Moribane por meio de parceria entre associações locais e o sector privado através dos de investimento do Banco Mundial. A comunidade de Moribane é representada pela associação Cubatana Moribane que trabalha em parceria com a Ecomicaia, um ramo da fundação Micaia que está virada para componente comercial. Dessa parceria, resultou na criação de Ndzou Camp Ldta, que é uma empresa de exploração turística. Ndzou Camp Ldta é formada por um capital misto, constituído por 60% pertencente a Cubatana Moribane e os restantes a Ecomicaia. Os fundos da Cubatana Moribane são provenientes do Banco Mundial. Para se aceder aos fundos do Banco Mundial é necessário que a associação esteja criada e legalizada e, que encontre um parceiro do sector privado interessado em explorar as áreas de Chimanimani. O empenho da Fundação Micaia no empreendimento foi decisivo para que a Cubatana Moribane se beneficiasse do fundo. O acordo entre as duas instituições representantes do Ndzou Camp Ldta é a construção e gestão de um Lodge em Moribane, cujos lucros são repartidos de acordo com o percentual de participação no empreendimento. A Ecomicaia tem um contracto de exploração conjunta do empreendimento de 10 anos. Findo o tempo, a associação Cubatana Moribane passará a ser a única gestora. O Ndzou Camp Ldta é a única empresa mista criada que está a beneficiar-se directamente dos fundos para gestão de Chimanimani. Com efeito, várias comunidades têm-se beneficiado indirectamente com a instalação da associação Cubatana Moribane, como a reabilitação de estradas, colecta de material local para a construção e reabilitação dos alojamentos turísticos e dos escritórios da Reserva de Chimanimani, estes benefícios melhoraram a gestão de Chimanimani, uma vez para a concretização destes empreendimento requereram o envolvimento de vários actores. Foto 1: Construção do Lodge em Moribane Fonte: Matos, 2010 A foto ilustra o período de construção de lodge na comunidade de Moribane antes de 2010, pelo que, requereu um trabalho colaborativo com as comunidades para que com base em materiais locais possa-se erguer um empreendimento com características florestais, faunísticas, todo o ecossistema e tipificação da biodiversidade da reserva de Chimanimani. O envolvimento das comunidades locais no período de construção não só serviu de um momento de interacção com os representantes do projecto, a Ecomicaia e Cubatana Moribane, e por via informal, transmitir aos demais membros da comunidade sobre a importância desse empreendimento e os benefícios que as comunidades usufruirão. Portanto, trata-se de um projecto que o princípio fundamental era o envolvimento de vários actores para que se aproprie dos objectivos da política de gestão da reserva de Chimanimani. CONSIDERAÇÕES FINAIS Este trabalho visa analisar as dinâmicas de colaboração entre múltiplos actores na gestão da Reserva Nacional de Chimanimani, um processo de análise de interacção entre actores a partir do fomento de produção de mel, de peixe e distribuição de sementes como processo de incentivo as comunidades de modo a desenvolver actividades que garantam o seu rendimento. Este fenómeno, é analisado a partir da convergência de interesses de vários actores e a sua influência na gestão da reserva de Chimanimani. A pesquisa partiu de um questionamento que referia que: Como a convergência entre múltiplos interesses de vários actores pode determinar o sucesso de gestão da política de conservação dos recursos florestais da reserva de Chimanimani? Numa perspectiva de reflectir os resultados da coligação dos interesses de entre vários actores sobre a gestão da reserva, portanto, buscou-se a forma de gestão que pudesse harmonizar os vários interesses de múltiplos actores, isto é, um trabalho de colaboração com vista a alcançar o sucesso na gestão das políticas de conservação da biodiversidade da reserva. Assim, levantou-se o pressuposto de que o sucesso de uma política do sector ambiental, concebida aqui como a política de conservação dos recursos florestais, especificamente de gestão da Reserva de Chimanimani, depende do melhor envolvimento dos múltiplos actores no processo para uma melhor apropriação dos objectivos perseguidos. Portanto, existe, portanto, uma relação e colaboração entre múltiplos actores e os resultados da política de conservação da biodiversidade da reserva de Chimanimani. Todavia, o trabalho de recolha de dados, demonstrou que apesar da política de conservação da biodiversidade ser aprovada ao nível central, a sua concretização é feita ao nível local, junta as comunidades. Assim, a interacção que surgem entre a direcção de Chimanimani e as comunidades locais efectiva a política de conservação da biodiversidade. Entretanto, o processo de interacção entre os actores locais resultou na capacitação das comunidades como guias turísticas, fiscalizadores locais de maneira apropriarem-se dos objectivos de gestão da reserva. Podemos constatar também que a posse de fundos financeiros, dita, de certa forma, as acções a serem desenvolvidas pela Administração Nacional das Áreas de Conservação e isso desenrola-se até ao nível local, logo, são as instituições internacionais como o Banco Mundial dedicadas a preservação da biodiversidade e a melhoria das condições de sobrevivência das comunidades que indicam as actividades de conservação que os actores centrais devem prosseguir. Portanto, a gestão da Reserva de Chimanimani ainda pode ser melhorada sobretudo em dotar os actores locais, particularmente as comunidades com ferramentais de uso sustentável de recursos, no sentido de fortalecer a produção de peixe para comercialização, doações de moagens comunitárias e cantinas gerida pela comunidade para que as comunidades não desenvolvam actividades que põem em causa a gestão de Chimanimani mas, que no desenvolvimento dessas actividades sejam fiscais aos actores envolvidos em actividades ilegais, principalmente de contrabando de madeira. Os resultados corroboram com a hipótese levantada uma vez que a implementação e gestão da política de conservação da biodiversidade na Reserva de Chimanimani são materializadas ao nível local, através de um processo de colaboração e interacção entre os doadores, administração da reserva de Chimanimani, as ONG’s e as comunidades. Assim, o desenvolvimento das actividades ecoturísticas, fomento da produção de mel e de peixe na região de Chimanimani são aplicados num ambiente envolvente de actores, para que por meio deste, colaborem com vista no alcance dos objectivos da política de gestão da biodiversidade de Chimanimani. Alguns elementos levantados suscitam o aprofundamento para as pesquisas futuras, particularmente os desafios de colaboração entre vários actores na gestão das políticas de conservação da biodiversidade na Reserva de Chimanimani, tendo em conta que o envolvimento das comunidades não se limita apenas em influenciar as agendas dos órgãos locais especificamente na área do ambiente mas sim, um envolvimento na concepção, implementação, gestão e avaliação da política de gestão da Reserva Nacional de Chimanimani. Com o estudo, não se procurou dar respostas acabadas sobre os problemas actuais de gestão integrada da Reserva de Chimanimani mas, reflectir numa gestão colaborativa, isto é, que o sucesso de gestão da Reserva de Chimanimani não é garantido por uma única entidade, no caso a Administração Nacional das Áreas de Conservação com autonomia financeira, administrativa e patrimonial mas através do envolvimento directo e activo de várias entidades, governamentais, administrativos, sector privado, ONG’s e os cidadãos que compartilham responsabilidade, riscos e confiança na gestão da biodiversidade. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ADAMS, W e HULME, D. Conservation and community: Changing narratives, policies and practices in Africa conservation. Cape Town: David Phillip, 2001. ALFORD, J. Why do public sector clients co-produce? Towards a contingency theory. Administration e Society, 2002. __________. Engaging public sector clientes: From service delivery to co-production. 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